Publicado por Jornalismo B
O debate sobre a pretensa imparcialidade jornalística deve continuar sendo feito enquanto a mídia dominante insistir nessa enorme mentira, mas alguns casos levam ao extremo a parcialidade e o total desapego à realidade. Esse tipo de situação costuma acontecer quando comentaristas e repórteres insistem tanto em demonizar personagens ou instituições que acabam acreditando em suas próprias mentiras, e, como espectadores encantados por suas próprias distorções, passam a odiar, e, com a emoção à flor da pele, ultrapassam os limites razoáveis do jornalismo puramente opinativo. Afirmam que o que apresentam é uma reportagem, mas sabem que o que fazem é pura opinião – e opinião sem base na realidade. Acreditam, em silêncio, que apenas opinam, mas extrapolam a ação opinativa para atacar, violentar e agredir personagens, instituições e a inteligência de quem está do outro lado da mensagem.
É isso o que tem acontecido na cobertura do julgamento dos acusados de levar a cabo um esquema apelidado de “mensalão”, e é o que acontece quando a mídia dominante, cega de ódio por ver as velhas oligarquias sendo derrubadas pelo povo, fala sobre os governos progressistas da América Latina, especialmente a Venezuela.
“Reportagem” desta quinta-feira no Bom Dia Brasil, matinal da TV Globo, falou sobre o que chamou de “campanha de Chávez” – o que já mostraremos porque não é verdade. A matéria, de Delis Ortiz, começa falando de um possível projeto do presidente do Equador, Rafael Correa, de “liderar a esquerda na América Latina”. Esse discurso vem sendo disseminado pela mídia oligárquica do subcontinente há tempos, e sem qualquer base de informação. É puramente uma tentativa de dividir para enfraquecer os cada vez mais integrados governos progressistas da AL. Na chamada para a matéria, Renato Ribeiro deixa clara a intenção: “se depender do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, ou pelo menos da equipe que planeja a campanha dele, isso não vai acontecer (a liderança de Correa)”.
A matéria de Delis é sobre peças gráficas que mostram Chávez dançando, cortando o cabelo com um visual jovem, lutando boxe, andando de moto. Mas o texto debocha do físico de Chávez, e cita “santinhos modernos” em que o presidente, segundo a “repórter”, “tenta vender a imagem de um líder que personifica mudança; mas está no poder há 14 anos. Quer aparentar a metade dos quase 60 anos que tem. O candidato desenhado esconde o homem debilitado e doente que tenta a terceira reeleição”. É claro que a “reportagem” não é feita a partir da Venezuela. A “repórter” está na Argentina, em Buenos Aires. Por que ir até lá conhecer a realidade, se a realidade não importa?
A realidade é que o que a Globo chama de “santinhos” foi feito por um coletivo de bairro, o Miranda es Otro Beta, não pela campanha de Chávez. Como explica um integrante do coletivo ao site Cubadebate, “se trata de uma iniciativa independente que não está vinculada com a campanha do governo”. Se Delis houvesse entrevistado alguém para sua contundente matéria, saberia disso. Saberia também que as peças ridicularizadas por ela se relacionam com recente fala do presidente venezuelano: “Chávez ya no soy yo, Chávez somos todos, Chávez es otro beta, Chávez es Petare, Chávez ya no soy yo, yo soy pueblo”.
Mas a Globo não é só feita de ódio. Também há amor, mas por Henrique Capriles, candidato da oposição, o candidato que quer fazer a Venezuela voltar ao que era antes de Chávez, um paraíso para os ricos e um inferno para os pobres. Com Chávez, a Venezuela tornou-se o país menos desigual da América Latina. Mas isso a matéria não disse. Disse, sim, que Capriles é “um adversário nem um pouco raquítico. (…) tem 40 anos, agita a campanha com vigor físico, fazendo caminhadas, comícios pelo interior. Vende com a própria imagem a encarnação do novo, que Chávez tanto queria ser”. É um tipo de discurso que já vimos aqui pelo Brasil. O “vigor físico, as caminhadas” e a “encarnação do novo” que a esquerda gostaria de ser não lembram a campanha de Fernando Collor, fortemente apoiada por essa mesma emissora? A esquerda como ultrapassada e a direita como nova, ativa, revigorante, jovem, é tudo o que a Globo tenta vender. Mas, por baixo da máscara que esconde as rugas de Capriles e de sua mídia internacional, não há nada mais do que as velhas oligarquias, políticas e midiáticas. Escondendo a velhice ideológica de Capriles a velha mídia tenta esconder seu próprio aspecto cadavérico.
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