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Blog Comunica Tudo

3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.
Este blog foi criado em 2008 como um espaço livre de exercício de comunicação, pensamento, filosofia, música, poesia e assim por diante. A interação atingida entre o autor e os leitores fez o trabalho prosseguir. Leia mais: http://comunicatudo.blogspot.com/p/sobre.html#ixzz1w7LB16NG Under Creative Commons License: Attribution Non-Commercial No Derivatives

O suicídio da imprensa brasileira

10 de Janeiro de 2013, 22:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

A imprensa brasileira está sob risco de desaparição e, de imediato, da sua redução à intranscendência, como caminho para sua desaparição.

Mas, ao contrário do que ela costuma afirmar, os riscos não vem de fora – de governos “autoritários” e/ou da concorrência da internet. Este segundo aspecto concorre para sua decadência, mas a razão fundamental é o desprestígio da imprensa, pelos caminhos que ela foi tomando nas ultimas décadas.


No caso do Brasil, depois de ter pregado o golpe militar e apoiado a ditadura, a imprensa desembocou na campanha por Collor e no apoio a seu governo, até que foi levada a aderir ao movimento popular de sua derrubada.

O partido da imprensa – como ela mesma se definiu na boca de uma executiva da FSP – encontrou em FHC o dirigente politico que casava com os valores da mídia: supostamente preparado pela sua formação – reforçando a ideia de que o governo deve ser exercido pela elite -, assumiu no Brasil o programa neoliberal que já se propagava na América Latina e no mundo.

Venderam esse pacote importado, da centralidade do mercado, como a “modernização”, contra o supostamente superado papel do Estado. Era a chegada por aqui do “modo de vida norteamericano”, que nos chegaria sob os efeitos do “choque de capitalismo”, que o país necessitaria.

O governo FHC, que viria para instaurar uma nova era no país, fracassou e foi derrotado, sem pena, nem glória, abrindo caminho para o que a velha imprensa mais temia: um governo popular, dirigido por um ex-líder sindical, em nome da esquerda.

A partir desse momento se produziu o desencontro mais profundo entre a velha imprensa e o país real. Tiveram esperança no fracasso do Lula, via suposta incapacidade para governar, se lançaram a um ataque frontal em 2005, quando viram que o governo se afirmava, e finalmente tiveram que se render ao sucesso de Lula, sua reeleição, a eleição de Dilma e, resignadamente, aceitar a reeleição desta.

Ao invés de tentar entender as razoes desse novo fenômeno, que mudou a face social do pais, o rejeitou, primeiro como se fosse falso, depois como se se assentasse na ação indevida e corruptora do Estado. A velha mídia se associou diretamente com o bloco tucano-demista até que, se dando conta, angustiada, da fragilidade desse bloco, assumiu diretamente o papel de partido opositor, de que aqueles partidos passaram a ser agregados.

A velha mídia brasileira passou a trilhar o caminho do seu suicídio. Decidiu não apenas não entender as transformações que o Brasil passou a viver, como se opor a elas de maneira frontal, movida por um instinto de classe que a identificou com o de mais retrogrado o pais tem: racismo, discriminação, calunia, elitismo.

Não há mais nenhuma diferença entre as posições da mídia – a mesma nos principais órgãos – e os partidos opositores. A mídia fez campanha aberta para os candidatos à presidência do bloco tucano-demista e faz oposição cerrada, cotidiana, sistemática, aos governos do Lula e da Dilma.

Tem sido a condutora das campanhas de denúncia de supostos casos de corrupção, tem como pauta diária a suposta ineficiência do Estado – como os dois eixos da campanha partidária da mídia.

Certamente a internet é um fator que acelera a crise terminal da velha mídia. Sua lentidão, o fato de que os jovens não leem mais a imprensa escrita, favorece essa decadência.

Mas a razão principal é o suicídio politico da velha mídia, tornando-se a liderança opositora no pais, editorializando suas publicações do começo ao final, sendo totalmente antidemocráticas na falta de pluralismo sequer nas paginas de opinião, assumindo um tom golpista histórico na direita brasileira.

Caminha assim inexoravelmente para sua intranscendência definitiva. Faz campanha, em coro, contra o governo da Dilma e contra o Lula, mas estes tem apoio próximo aos 80%, enquanto irrisórias cifras expressam os setores que assimilam as posições da mídia.

Uma pena, porque a imprensa chegou a ter, em certos momentos, papel democrático, com certo grau de pluralidade na história do pais. Agora, reduzida a um simulacro de “imprensa livre”, ancorada no monopólio de algumas famílias decadentes, caminha para seu final como imprensa, sob o impacto da falta de credibilidade total. Uma morte anunciada e merecida.

Escrito por Emir Sader



O som ao redor ou o som que amedronta a classe média

7 de Janeiro de 2013, 22:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda


Por José Gerado Couto*, do blog IMS

Entra finalmente em cartaz o filme brasileiro mais incensado dos últimos anos, O som ao redor. Premiado em festivais no Brasil e no exterior, elogiado unanimemente pela crítica, o longa de Kleber Mendonça Filho entrou nas listas de melhores do ano do New York Times e da Film Comment, entre outras publicações de prestígio.

Todo esse auê se justifica. É um filme que, como poucos, radiografa sua época sem perder de vista o processo histórico de longa duração em que ela se insere. Não se perde nas aparências do presente, não fetichiza o novo, mas, pelo contrário, revela a presença do arcaico no moderno, a reiteração sob novas formas de um modelo civilizatório ao mesmo tempo perverso e fascinante – tudo isso sob a aparência de uma prosaica crônica urbana ambientada num bairro recifense de classe média.


Escrevi há alguns meses sobre o filme e não quero me repetir. Só acrescento um dado que àquela altura eu desconhecia e que pode ajudar a enriquecer a leitura do filme. Na crítica, eu qualificava de estranhas e misteriosas as aparições fugazes de um garoto negro – num telhado, numa casa vazia, no alto de um árvore. Depois fiquei sabendo que se tratava de alusões ao “menino-aranha” que povoou a crônica policial de Recife na década de 90: o garoto Tiago João da Silva, que desde os nove anos de idade escalava com as próprias mãos prédios residenciais da cidade para assaltar apartamentos. Tiago foi detido e fugiu várias vezes, até ser morto a tiros aos 17 anos, em 2005.

Saci atualizado

O curioso é que no início de 2012, quando O som ao redor já estava pronto, surgiu em Recife outro garoto com as mesmas características, o que levou a imprensa a rememorar o caso. No contexto do filme de Kleber Mendonça, esse fait divers de página policial ganha um sentido histórico-social poderoso: o medo da classe média e das elites brancas diante da ameaça difusa de invasão do “seu” espaço pelos pretos e pobres. É, de certo modo, uma atualização urbana da lenda do traiçoeiro e imprevisível saci-pererê.

A reforçar o viés político dessa fabulação, numa cena do filme uma menina de classe média levanta de sua cama no meio da noite, vai até a janela e vê uma horda de meninos-aranha se espalhando pelos telhados e árvores do bairro. Não sabemos se é uma visão, um sonho ou uma imagem “real” – o fato é que poucas cenas sintetizam de forma tão eficiente o momento que vivemos, de ascensão dos que não tinham nada e de apreensão dos que têm alguma coisa em face ao que pode acontecer.

Duas últimas observações sobre O som ao redor: apesar de seu inegável valor cultural, ele está entrando em relativamente poucas salas pelo Brasil afora. No Rio, por exemplo, entra em quatro cinemas, enquanto De pernas pro ar 2 está em mais de cinquenta. Sinal dos tempos. Além disso, outro perigo ronda o filme: o das falsas expectativas. Depois de tanto aplauso e elogio, muitos espectadores talvez entrem no cinema esperando ver algo espetaculoso (como foram Cidade de Deus e Tropa de elite, por exemplo). E a qualidade maior de O som ao redor é, justamente, a sutileza, o subtom, a entrelinha.

Janeiro histórico

A acreditar nos cronogramas das distribuidoras, este será o melhor mês de lançamentos nos nossos cinemas em muitos anos, talvez décadas. Estão previstos, entre outros, os seguintes títulos: Django livre (Quentin Tarantino), Amour (Michael Haneke), Além das montanhas (Cristian Mungiu), César deve morrer (Paolo e Vittorio Taviani), Lincoln (Steven Spielberg), O mestre (Paul Thomas Anderson), A hora mais escura (Kathryn Bigelow), Killer Joe (William Friedkin), Querida, vou comprar cigarros e já volto (Gastón Duprat e Mariano Cohn) e País do desejo (Paulo Caldas). Bom proveito.

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*José Gerado Couto é crítico de cinema e tradutor. Publica suas criticas no blog do IMS.



Ano novo, PIG Velho

7 de Janeiro de 2013, 22:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda


Publico abaixo um excelente texto de Bepe Damasco, sobre o PIG e o nosso governo. Boa leitura:

Enquanto a presidenta Dilma vive a repetir as platitudes de sempre contra uma Ley de Medios à brasileira, o PIG entrou 2013 com a corda toda, pisando fundo no acelerador da mentira e da desinformação, movido pela obsessão golpista costumeira. Não que isso cause um fiapo de surpresa a quem quer que seja. O problema é a falta de luz no fim do túnel, na medida em que a presidenta, revelando lamentável desconhecimento do que está em jogo na luta pela democratização das comunicações no Brasil, tormou a avisar ao PT que não apoiará qualquer proposta que restrinja a liberdade de expressão no Brasil. Pessoa dotada de soberbas e conhecidas qualidades, ela, infelizmente, confunde liberdade de expressão com liberdade de monopólio.

Faria muito bem à nossa incipente democracia se a presidenta recuperasse o que disse o ex-ministro Franklin Martins sobre o anteprojeto que preparou :"Não existe nada no anteprojeto que não esteja previsto na Constituição. O marco regulatório é nada além nem aquém do que diz a Constituição." E mais : segundo Franklin, o processo de convergências das mídias é uma realidade e mais cedo ou mais tarde o governo terá de tratar dele. Caso contrário, o mercado o fará. "E quando o mercado decide, prevalece a lei do mais forte. O setor de telefonia fatura 13 vezes mais que o de radiodifusão. Quanto mais tempo levar para regular, maior é a força deles de se impor nessa discussão."

E é justamente por ter mandado seu minstro das Comunicações, Paulo Bernardo, engavetar o trabalho do Franklin que Dilma é obrigada a assistir, com pouca margem para reação, à tentativa desesperada da direita midiática de emparedá-la. E como o STF está em recesso, os canhões agora estão apontados para a economia. A estratégia, comum a Veja, Folha, Globo e Estadão, é tão simples quanto calhorda : ignorar que o índice de desemprego é o menor da história, que existe uma gravíssima crise internacional, que as medidas contracíclicas do governo para enfrentar essa crise mantiveram milhões de postos de trabalho e vão fazer o país voltar a crescer de forma vigorosa em 2013, que 16 milhões de brasileiros deixaram a miséria absoluta no governo Dilma, que o Brasil tem 370 bilhões de dólares de reservas, que a inflação está sob controle, que os juros foram reduzidos aos patamares mais baixos que se têm notícia, que o governo enfrentou a sabotagem das empresas de energia controladas pelos governos tucanos e vai reduzir a energia em 20% já a partir do próximo mês.

Reparem que a cada dia, no afã de torcer contra o país por interesses partidários, a mídia tem menos escrúpulos para definir sua pauta. Não custa lembrar o bombardeio da passagem do ano :

"Brasil pode ter que racionar energia" - Comemorando o baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas brasileiras devido à estiagem, o monopólio midiático, inconformado com a queda no preços das tarifas de energia que se aproxima, passou a prever um cenário catastrófico com aumento de tarifas e racionamento. Destaque absoluto para a cara de pau de uma reportagem da "rádio que troca notícia", que se fartou de ouvir "especialistas" do setor, mas não se deu ao trabalho de entrevistar um só integrante do governo. Jornalismo de esgoto na veia.
Contrariados porque a presidenta Dilma disse na lata deles que chega a ser "ridículo" prever racionamento de energia, o PIG partiu para o ataque. Não adianta explicar que os investimentos em geração e distribuição foram e estão sendo feitos em níveis adequados e que as termelétricas seguram o tranco na hora da emergência. Campeã das previsões furadas, a mídia deve ter se sentido afogada pelas chuvas que voltaram a cair na última semana.

"Governo faz maquiagem para fechar contas"- O mundo caiu. A credibilidade fiscal do país foi à breca. A estabilidade conquistada a duras penas nos últimos 20 anos (malabarismo para incluir os anos FHC) virou pó. O governo praticou estelionado fiscal.
Esse festival de imbecilidades tomou conta dos jornalões nos últimos dias. A realidade é bem outra. Tudo que a equipe econômica fez, rigorosamente dentro da lei, foi descontar o valor dos investimentos feitos no PAC das contas do superávit primário e capitalizar as estatais e bancos públicos com títulos públicos e não com aporte direto de recursos. Deve ser duro para um sujeito íntegro, sério e competente como o ministro Mantega dar de cara no jornal dos Marinho com a "urubóloga" Miriam Leitão acusando-o de ter patrocinado um estelionado fiscal. Se esse governo não fosse tão leniente com os serviçais do PIG, seria o caso de uma dura resposta pública.

"Fantástico mostra o desperdício em obras públicas" - Pinçando problemas em algumas obras públicas, a reportagem do Fantástico deste domingo parece feita sob medida para figurar num programa eleitoral do PSDB. A matéria faz um esforço enorme para dar a impressão que o Brasil é um grande canteiro de obras abandonadas, sempre na linha demagógica do tipo "quem paga a conta é você". Problemas existem em obras de infraestrutura no Brasil, Argentina, Espanha, EUA, Rússia, França, Itália, Reino Unido, em qualquer parte do mundo.

Para Ali Kamel, que vai transformando o Fantástico num grande panfletão dominical contra o governo, não há nemhum mérito nas obras do PAC. Já o ambicioso e elogiado programa de investimentos em enfraestrutura anunciado pelo Planalto, com investimentos de mais 130 bi em rodovias, ferrovais, portos e aeroportos sequer é citado na matéria.

O mais ridículo e patético, no entanto, foi guardado para o final, no qual uma "consternada" repórter entrevista, sob luz de lamparina, uma senhora dos grotões do Brasil em cuja residência a luz elétrica ainda não chegou. Estimulando essa brasileira humilde a lamentar não poder assistir às novelas da Globo, a jornalista sonegou a informação essencial quando o assunto é energia elétrica no Brasil : o Programa Luz para Todos, do governo federal, promoveu uma verdadeira revolução no campo, levando em 10 anos mais luz aos lares brasileiros do que nas últimas três décadas somadas. Constrangida por não ter dado espaço para ninguém do governo, a apresentadora do Fantástico fechou o simulacro de matéria jornalística informando que a produção do programa tentou, em vão, falar com o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, por duas semanas consecutivas.

Pudera, o ministro está de licença médica desde novembro. Será que o Fantástico não sabe? Incompetência e má-fé têm limites.



A horrível verdade sobre o estupro em Nova Délhi

6 de Janeiro de 2013, 22:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda


Por Sonia Faleiro

Morei 24 anos em Nova Délhi, uma cidade onde o assédio sexual é tão regular quanto o café da manhã. Todos os dias, em algum lugar da cidade, há um caso de estupro.

Quando adolescente, aprendi a me proteger. Nunca ficava sozinha, se possível, e andava depressa, cruzando os braços sobre o peito, recusando todo contato visual ou mesmo um sorriso. Abria caminho no meio da multidão curvando os ombros para frente, e evitava sair de casa depois do escurecer, se não fosse num carro particular. Numa idade em que as jovens em todos os outros lugares começam a fazer suas primeiras experiências com um estilo mais ousado de vestuário, eu usava roupas duas vezes maiores do que o meu tamanho. Ainda não consigo me vestir de forma a parecer atraente sem ter a sensação de estar me expondo ao perigo.

A situação não mudou quando cheguei à idade adulta. O spray de pimenta não existia ainda e minhas amigas, todas de classe média ou média alta como eu, carregavam alfinetes ou outros objetos como armas no caminho da universidade e do emprego. Uma delas andava com uma faca e insistia que eu devia fazer o mesmo.

Recusei, mas havia dias em que ficava tão enraivecida que poderia usá-la - ou, pior ainda, alguém poderia usá-la contra mim.

O persistente concerto de assobios, miados, palavras sibiladas, alusões sexuais ou ameaças abertas continuaram. Grupos de homens andavam pelas ruas vadiando, e sua forma de comunicação eram as canções de filmes indianos que viviam cantando, repletas de duplos sentidos.

Para deixar claras suas intenções, mexiam a pélvis para frente quando uma mulher passava.

Não eram apenas os ambientes públicos que eram pouco seguros. Até na redação de uma importante revista onde eu trabalhava, no consultório de um médico, até mesmo numa festa privada - era impossível escapar da intimidação.

No dia 16 de dezembro, como o mundo agora sabe, uma mulher de 23 anos voltava para casa com o namorado depois do assistir ao filme As aventuras de Pi num shopping center de Délhi. Quando tomaram o que lhes pareceu um ônibus, os seis homens que estavam no veículo estupraram e torturaram a mulher de maneira tão brutal que destruíram seus intestinos. O ônibus fora apenas um chamariz. Eles espancaram brutalmente também o namorado da jovem e jogaram os dois fora do veículo, deixando-a à beira da morte.

A jovem não se rendeu. Ela começara aquela noite vendo um filme sobre um sobrevivente, e provavelmente sentiu-se determinada a sobreviver também. Então ela realizou outro milagre. Em Délhi, uma cidade onde a degradação das mulheres é comum, dezenas de milhares de pessoas foram às ruas e enfrentaram a polícia, as bombas de gás lacrimogêneo e os canhões de água para expressar sua revolta. Foi o maior protesto jamais realizado na Índia contra a agressão sexual e o estupro até aquele momento, e desencadeou manifestações em toda a nação.

A fim de proteger a identidade da vítima, seu nome não foi divulgado.

Mas embora ela continue sem nome, não ficou sem rosto. Para vê-lo, bastou que as mulheres se olhassem no espelho. A plena dimensão da sua vulnerabilidade finalmente foi compreendida.

Quando fiz 26 anos, mudei-me para Mumbai. A megalópole comercial e financeira tem sua carga de problemas específicos, mas, em termos culturais, é mais cosmopolita e liberal do que Délhi. Ainda zonza com a liberdade recém-conquistada, comecei a fazer matérias sobre o bairro da prostituição e percorria subúrbios perigosos tarde da noite - sozinha e usando transporte público. Acho que a minha experiência em Délhi teve um resultado positivo: fiquei agradecida pelo ambiente comparativamente seguro de Mumbai e resolvi aproveitar ao máximo.

Mas a jovem jamais terá esta oportunidade. Na manhã de sábado, 13 dias depois de ter sido brutalizada, esta estudante de fisioterapia, que sem dúvida sonhara em melhorar a vida das outras pessoas, perdeu a sua. Morreu por falência múltipla dos órgãos.

A Índia tem uma legislação contra o estupro; assentos reservados para as mulheres nos ônibus, policiais femininas; linhas especiais para pedir a ajuda da polícia. Mas estas medidas não têm tido eficiência diante de uma cultura patriarcal e misógina. Trata-se de uma cultura que acredita que o pior aspecto do estupro é a corrupção da vítima, que nunca mais poderá encontrar um homem para casar com ela - e que a solução é casar com o estuprador.

Estas crenças não se restringem às salas de estar, mas são expressas abertamente. Nos meses anteriores ao estupro coletivo, alguns políticos de destaque atribuíram o aumento das estatísticas sobre estupro à crescente utilização dos celulares pelas mulheres e ao fato de elas saírem à noite. "Somente porque a Índia conseguiu a liberdade depois da meia-noite não significa que as mulheres possam se aventurar a sair depois do anoitecer", disse Botsa Satyanarayana, líder do Partido do Congresso do Estado de Andhra Pradesh.

Denúncias. Mudar é possível, mas as pessoas devem denunciar logo os casos de estupro e de agressão sexual para que a polícia possa realizar as investigações, e os casos levados aos tribunais possam tramitar rapidamente e não demorar anos a fio. Dos mais de 600 casos de estupro relatados em Nova Délhi em 2012, somente um levou à condenação. Se as vítimas acreditam que receberão justiça, se mostrarão mais dispostas a falar. Se os supostos estupradores temerem as consequências de suas ações, não atacarão as mulheres nas ruas impunemente.

As dimensões dos protestos públicos e na mídia deixaram claro que o ataque constituiu um divisor de águas. A horrível verdade é que a jovem atacada no dia 16 teve mais sorte do que muitas vítimas de estupro. Ela foi uma das raras mulheres que receberam algo parecido com justiça. Foi hospitalizada, sua declaração foi gravada e em poucos dias todos os seis suspeitos do estupro foram presos e, agora, estão sendo processados por assassinato. Tal eficiência é algo incomum na Índia.

Não foi a brutalidade das agressões contra a jovem que tornou sua tragédia inusitada; foi o fato de que esta agressão, finalmente, provocou uma resposta.


TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA



A absurda acusação contra Latuff - Entrevista

3 de Janeiro de 2013, 22:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Charge de Carlos Latuff sobre a absurda acusação de antissemitismo
Publicado pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro

A conta não fecha: quandoum jornal europeu acaba sendo alvo de protestos por publicar charges ofensivas ao profeta Maomé, a liberdade de expressão é invocada em defesa da publicação. “Mas quando um cartunista como eu, que não tem foco sobre o judaísmo ou questões raciais, dedica seu trabalho a expor o apartheid israelense sobre os palestinos, recebe difamação”, resume Carlos Latuff.

Esta difamação voltou à tona na virada de 2012 para 2013, quando o Centro de Defesa dos Direitos Humanos Simón Wiesenthal, entidade israelense sediada em Los Angeles, colocou o cartunista na terceira posição de uma lista que aponta dez organizações ou pessoas consideradas mais antissemitas. Na tentativa de ilustrar sua posição no seu relatório, o instituto utilizou charge de Latuff que mostra o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, torcendo um cadáver palestino para obter votos eleitorais.


“Não fiquei surpreso. Não é a primeira vez que acontece esta tática de associar crítica ao estado de Israel ao antissemitismo. Existe uma série de organizações nos Estados Unidos e na Europa que se dedicam a este tipo de tarefa: identificar na imprensa, na Internet, artigo e opiniões que sejam contrárias à política de Israel para expô-los como antissemitas”, lembra Latuff.

A lista do Centro Simón Wiesenthal é encabeçada por Mohammed Badie, líder da Irmandade Muçulmana (grupo islâmico), seguido por Mahmud Ahmadinejad, presidente do Irã. O terceiro nome é do cartunista brasileiro – que está, na lista, à frente do partido nazista grego, por exemplo. Nada que abale a disposição de Latuff em continuar denunciando os crimes do estado de Israel sobre os palestinos por meio de suas charges.

“Na verdade, (a lista) deixa a gente satisfeito porque mostra que o trabalho está surtindo efeito. O que lamento é a utilização do antissemitismo para fins políticos”, diz ele. Uma petição online, já assinada por mais de 450 pessoas, exige “o fim da manipulação do antissemitismo para fins políticos”.

A seguir, confira resumo da entrevista que o site do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio fez com Carlos Latuff na última quinta-feira (3/1). O cartunista fala, entre outras coisas, sobre sua segurança e a cobertura da imprensa no conflito entre Israel e Palestina.

Você pensa em tomar alguma atitude jurídica em relação à acusação de antissemitismo?
Se estivesse nos Estados Unidos, talvez faria. Mas do Brasil fica mais complicado abrir processo. Esta lista na verdade é uma disputa ideológica. Quando coloca uma pessoa que tem trabalho destacado em favor dos palestinos numa lista junto com gente de extrema direita e fundamentalista, está se tentando confundir, colocar no mesmo barco, ódio com críticas ao estado de Israel. O que está em jogo é uma disputa política e ideológica. Eu emiti uma nota a respeito disso. Respondi com uma charge. A resposta tem que se dar também no nível político-ideológico. Críticas ao estado de Israel não são ataques aos judeus.

Há temor pela sua segurança depois da divulgação da lista?
Quando se apresenta um crítico como sendo racista, antissemita, abre-se a possibilidade de que ele seja alvo de ações violentas – oficiais ou não oficiais. Lembro de um site, ligado ao Likud (partido de direta de Israel), que em 2006 publicou, em hebraico, artigo longo a meu respeito. O autor do texto cobrava providências: onde está Israel que não fez nada contra Latuff? Mesmo que a lista não seja uma ameaça objetiva, expõe você a qualquer tipo de ação.

Qual a sua avaliação da cobertura da grande imprensa sobre o conflito entre Israel e Palestina?
No Ocidente são notáveis as coberturas pró-Israel. Reforçam a ideia de que Israel é uma eterna vítima e de que os palestinos são agressores. Existe quase uma orquestração neste sentido. Ela reforça estereótipos, o senso comum, e não apresenta o lado dos palestinos. Mas não é só neste ponto: a violência policial sobre pobres e negros nas favelas é sempre tendenciosa, em favor da polícia. Particularmente depois do fenômeno Tropa de Elite (filme) e as UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a imprensa cada vez mais tem apoiado integralmente as forças de repressão em detrimento das comunidades de favelas. Pede-se cada vez mais polícia, mas não se questiona que polícia vamos colocar nas ruas. A grande imprensa é tendenciosa. No passado, os estados autoritários tinham máquinas de propaganda. Hoje, no caso do Brasil, as oligarquias não precisam de ministros da propaganda, elas têm a grande imprensa para defender seus interesses.

Foto: Arquivo Pessoal

Mais charges de Carlos Latuff aqui.