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Nota de solidariedade a Daniel Fonsêca
4 de Novembro de 2012, 22:00 - sem comentários ainda O Intervozes se manifesta contra a criminalização que a empresa de bebidas Ypióca está promovendo com o jornalista e militante do coletivo Daniel Fonsêca.O Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social se solidariza com o jornalista e militante do coletivo Daniel Fonsêca no processo de criminalização que está sofrendo pela empresa de bebidas Ypióca.
No dia 6 de novembro de 2012, ocorre a audiência de julgamento do processo que a empresa move contra Daniel Fonsêca desde 2007, acusando-o de injúria, calúnia e difamação por se manifestar em defesa dos direitos dos índios Jenipapo-Kanindé e da preservação da região da Lagoa da Encantada, em Aquiraz (CE).
A Ypióca processou Daniel e o professor da Universidade Federal do Ceará Jeovah Meireles, em processos distintos - após declarações feitas em um seminário e pela produção de um artigo que sequer chegou a ser publicado - por eles terem relatado que a empresa utiliza água da Lagoa Encantada (sagrada para o povo Jenipapo-Kanindé) para alimentar seus 4.000 hectares de monocultura de cana para a produção de cachaça, além de poluir o lençol freático com os descartes do processo industrial de fabricação. O processo contra o professor foi finalizado em 2010.
Ações com esse caráter representam a judicialização de conflitos sociais na tentativa de intimidar a divulgação de manifestos, pesquisas e produções jornalísticas que defendam direitos fundamentais violados pela ação de empresas ou de governos. A Ypióca tenta, assim, impedir a produção acadêmica e jornalística sobre sua atuação no país, agindo contra a democracia, a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão da população brasileira.
O Intervozes reafirma seu compromisso com a defesa das liberdades de expressão, de organização e de manifestação e do livre exercício dos profissionais de comunicação.
Brasília, 5 de novembro de 2012.
Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social
A volta do filho (de papai) pródigo ou a parábola do roqueiro burguês
3 de Novembro de 2012, 22:00 - sem comentários aindaPor Socialista Morena
Nem todo direitista é derrotista, mas todo derrotista é direitista. Reparem no capricho do léxico: as duas palavras são quase idênticas. Ambas têm dez letras, soam similares e até rimam. Se você tem dúvida se alguém é de direita observe essas características. Começou a falar mal do Brasil e dos brasileiros, a demonstrar desprezo por tudo daqui, a comparar de forma depreciativa com outros países, é batata. Derrotista/direitista detectado.
Temos hoje no Brasil duas personalidades célebres pelo derrotismo explícito e pelo direitismo não assumido: os roqueiros Lobão e Roger Moreira, do Ultraje a Rigor. Eu ia citar também Leo Jaime, outro direitoso do rock nacional, mas não posso classificá-lo como um derrotista típico –fora isso, no entanto, cabe perfeitamente no figurino que descreverei aqui. Os três são cinquentões: Lobão tem 55, Roger, 56 e Leo, 52.
Da geração dos 80, Lobão sempre foi meu favorito. Eu simplesmente amo suas canções. Para mim, Rádio Blá,Vida Bandida, Vida Louca Vida e Decadence Avec Elegance são clássicos. Além de Corações Psicodélicos, em parceria com Bernardo Vilhena e Julio Barroso, ai, ai… Adoro. E não é porque Lobão se transformou em um reacionário que vou deixar de gostar. Sim, Lobão virou um reaça no último. Alguém que voltasse agora de uma viagem longa ao exterior ia ficar de queixo caído: aquele personagem alucinado, torto, jeitão de poeta romântico, que ficou preso um ano por porte de drogas, se identifica hoje com a direita brasileira mais podre.
Não me importa que Lobão critique o PT ou qualquer outro partido. O que me entristece é ele ter se unido ao conservadorismo hidrófobo para perpetrar barbaridades como a frase, dita ano passado, em tom de pilhéria: “Há um excesso de vitimização na cultura brasileira. Essa tendência esquerdista vem da época da ditadura. Hoje, dão indenização a quem seqüestrou embaixadores e crucificam os torturadores, que arrancaram umas unhazinhas”. No twitter (@lobaoeletrico), se diverte esculhambando o país e os brasileiros, sempre nos colocando para baixo. “Antigamente éramos um país pobre e medíocre… terrível. Hoje em dia somos um país rico e medíocre… pior ainda”, escreveu dia desses.
Os anos não foram mais generosos com Roger Moreira, do Ultraje. O cara que cantava músicas divertidíssimas como Nós Vamos Invadir Sua Praia, Marylou ou Inútil virou um coroa amargo que deplora o Brasil e vive reclamando de absolutamente tudo com a desculpa de ser “contra os corruptos”. É um daqueles manés que vivem com a frase “imagine na Copa” na ponta da língua para criticar o transporte público, por exemplo, sem nem saber o que é pegar um ônibus. Os brasileiros, segundo Roger, são um “povo cego, ignorante, impotente e bunda-mole”. Sofre de um complexo de vira-lata que beira o patológico. Ao ver a apresentação bacana dirigida por Daniela Thomas ao final das Olimpíadas de Londres, tuitou, vaticinando o desastre no Rio em 2014: “Começou o vexame”. Não à toa, sua biografia na rede social (@roxmo) é em inglês.
Muita gente se pergunta como é que isso aconteceu. O que faz um roqueiro virar reaça? No caso de ambos, a resposta é simples. Tanto Roger quanto Lobão são parte de um fenômeno muito comum: o sujeito burguês que, na juventude, se transforma em rebelde para contrariar a família. Mais tarde, com os primeiros cabelos brancos, começa a brotar também a vontade irresistível, inconsciente ou não, de voltar às origens. Aos poucos, o ex-revoltadex vai se metamorfoseando naqueles que criticava quando jovem artista. “Você culpa seus pais por tudo, isso é um absurdo. São crianças como você, é o que você vai ser quando você crescer” –Renato Russo, outro roqueiro dos 80′s, já sabia.
O carioca Lobão, nascido João Luiz Woerdenbag Filho, descendente de holandeses e filhinho mimado da mamãe, estudou a vida toda em colégio de playboy, ele mesmo conta em sua biografia. O paulistano Roger estudou no Liceu Pasteur, na Universidade Mackenzie e nos EUA. Nada mais natural que, à medida que a ira juvenil foi arrefecendo –infelizmente junto com o vigor criativo– o lado burguês, muito mais genuíno, fosse se impondo. Até mesmo por uma estratégia de sobrevivência: se não estivessem causando polêmica com seu direitismo, será que ainda falaríamos de Roger e Lobão? Eu nunca mais ouvi nem sequer uma música nova vinda deles. O Ultraje, inclusive, se rendeu aos imbecis politicamente incorretos e virou a “banda do Jô” do programa de Danilo Gentili.
Enfim, incrível seria se Mano Brown ou Emicida, nascidos na periferia de São Paulo, se tornassem, aos 50, uns reaças de marca maior. Pago para ver. Mas Lobão e Roger? Normal. O bom filho de papai à casa torna. A família deles, agora, deve estar orgulhosíssima.
Transporte público gratuito existe e não é coisa de maluco
30 de Outubro de 2012, 22:00 - sem comentários ainda Ao analisar que as tarifas estão chegando ao patamar dos R$ 3 para cada viagem (ou conjunto de viagens, no caso de São Paulo), é bom saber que existem exemplos que desafiam a lógica que impera no BrasilThalita Pires, Rede Brasil Atual
O tema do valor do transporte público é sempre sensível nas cidades brasileiras. A cada aumento de tarifa, vozes se levantam para cobrar um subsídio maior para o uso de ônibus e trens. A resposta das prefeituras e governos estaduais é sempre a mesma: alguém tem de pagar pelo sistema, cujos custos sempre aumentam. Mas essa discussão chegou em outro nível em várias cidades nos Estados Unidos e Europa. Nelas, os moradores não pagam para usar o transporte coletivo. Entre elas estão Châteauroux, Vitré e Compiègne, na França; Hasselt, na Bélgica; Lubben, na Alemanha e Island County, Chapel Hill, Vail e Commerce, nos Estados Unidos, entre outras. A próxima a adotar a ideia será Tallinn, a capital da Estônia, no final deste ano.
A ideia de gratuidade no transporte vai contra tudo o que nos disseram sobre o assunto aqui no Brasil, a saber: sem pagamento, o sistema ficaria sem recursos, e em algum momento se tornaria inviável. Mas existem teóricos e administradores públicos que defendem que é economicamente viável – ou até preferível – que as pessoas não paguem por ele.
As vantagens de não se cobrar pelo uso de trens e ônibus são várias: promoção de uma certa justiça social, já que o peso do pagamento de transporte público é grande para a população mais pobre, que é a que mais precisa dele; redução da emissão de poluentes; menos poluição sonora; redução do uso de combustíveis fósseis; diminuição dos gastos em obras viárias, já que o carro seria menos necessário; aumento do uso do espaço público, pois as pessoas precisariam andar mais nas ruas para usar o transporte; eliminação dos gastos com o sistema de cobrança, entre outras.
Em Châteauroux, cidade de 49 mil habitantes, a média de uso do ônibus era de 21 viagens por ano, contra uma média de 38 em outras cidades pequenas da França. Depois da implementação da gratuidade, esse número saltou para 61 viagens por ano. Em Hasselt, o uso do transporte público subiu mais de 1000% desde que passou a ser gratuito.
O aumento no número de usuários é um dos indicadores para o sucesso do sistema, pois significa que as pessoas trocaram de meio de transporte: se deixaram o carro, contribuíram para a diminuição do trânsito, e se de outra forma teriam ido a pé ou de bicicleta, ajudaram a reduzir os riscos de acidentes como atropelamentos, diminuindo ainda mais o gasto com os carros (nesse caso, os custos de acidentes desse tipo entram na conta do transporte individual motorizado).
Os teóricos do transporte gratuito dizem ainda que, a cada aumento de tarifa, existe uma diminuição no número de usuários, que passam a não poder pagar ou encontram uma alternativa economicamente mais viável para se locomover. Isso diminuiu ou até anula o aumento da arrecadação esperado com o aumento da tarifa, fazendo com que o sistema fique cada vez menos viável, já que menos pessoas têm de pagar mais para as mesmas viagens.
Outro motivo econômico importante para a abolição das tarifas é que o sistema de cobrança custa muito dinheiro. Um estudo patrocinado pela Administração Federal de Transportes dos Estados Unidos mostrou que os gastos com o sistema de cobrança pode chegar a 20% de toda a renda com o pagamento de tarifas. Isso inclui gastos com máquinas de vendas, pessoal, contagem do dinheiro coletado e custos afins.
Mas quem paga por isso, afinal?
Embora os sistemas de financiamento variem um pouco de cidade para cidade, o princípio é sempre o mesmo. O transporte público é bancado por impostos. Em Hasselt, na Bélgica, 1% dos impostos municipais vai para o sistema de ônibus. No condado de Island, Washington, 6% do dinheiro arrecadado com o imposto sobre vendas vai para o transporte público. Em Châteauroux, os recursos vêm dos impostos sobre os salários, pagos pelos empregadores. As possibilidades são variadas.Financiar o sistema de transporte com impostos pode parecer uma ideia, digamos assim, muito comunista. Mas por que faz mais sentido pagar desse modo por saúde, educação e, pior, construção de ruas e avenidas para os carros? Por uma questão de justiça social, o transporte público também poderia ser incluído no rol de serviços custeados por impostos. Afinal, quem não anda de transporte público, especialmente no Brasil e nos Estados Unidos, acaba escolhendo carro ou moto para se locomover, aumentando custos de obras, da saúde, da limpeza pública, entre outros, além de contribuir para a emissão de poluentes. Há aqueles que não têm outra alternativa senão andar, e esses seriam os maiores beneficiados.
O segredo para o sucesso da gratuidade nas cidades citadas – e até agora todas elas se consideram casos de sucesso – é o planejamento anterior. Algumas delas fizeram investimentos maciços no transporte público antes de abolir as tarifas, para tornar o sistema atraente para um maior número de pessoas.
A grande questão que fica é se isso seria aplicável no Brasil. Isso depende de estudos aprofundados, que só podem ser feitos individualmente em cada cidade. Nas metrópoles, por exemplo, os sistemas de transportes já são tão lotados que qualquer ideia nesse sentido teria de ser precedida por um aumento massivo na oferta de ônibus e transporte sobre trilhos. É mais provável, no entanto, que seja um conceito inaplicável em grandes cidades, restando a ideia de maior subsídio ao sistema. Em cidade menores, talvez esse conceito seja mais facilmente aplicável. Mas, ao analisar que as tarifas estão chegando ao patamar dos R$ 3 para cada viagem (ou conjunto de viagens, no caso de São Paulo), é bom saber que existem exemplos que desafiam a lógica que impera por aqui. Resta saber qual seria a popularidade dessas ideias entre administradores públicos, empresários do setor de transporte e contribuintes que acham que não seriam beneficiados com a medida.
Governo carioca quer demolir Escola Municipal Friedenreich
30 de Outubro de 2012, 22:00 - sem comentários ainda Esta semana, o Meu Rio recebeu o seguinte apelo:"Meu nome é Beatriz Ehlers, tenho 11 anos, e quando crescer eu quero ser arquiteta. Eu estudo na Escola Municipal Friedenreich, que é a 4ª melhor escola do Rio mas o Governo quer demolir ela e construir uma quadra para o Maracanã. Eu amo a minha escola e todos os alunos, professores e pais também amam ela! Foi aqui que eu aprendi a ler, escrever, usar computador, filmar e editar vídeos e principalmente a respeitar as outras pessoas. Nossa escola é diferente, é um exemplo! Nós pedimos a todos os cariocas e todas as escolas do Rio que assinem a carta de apoio e nos ajudem a impedir que a nossa escola seja demolida. Meus pais, eu e outros alunos vamos entregar essa carta diretamente para quem pode impedir que a escola seja demolida durante um encontro no dia 08 de Novembro."
Conversando com os pais da Bia, descobrimos que ela é uma das melhores alunas da Escola Municipal Friedenreich, considerada a 4ª melhor do município. Infelizmente o Governo planeja botar a escola da Bia abaixo e construir uma quadra antes de entregar o complexo Maracanã para ser administrado pela iniciativa privada.
Felizmente, ainda dá tempo de alterar o edital de concessão do Maracanã e evitar que a escola seja demolida, interrompendo um projeto pedagógico que se construiu em 20 anos. Só temos que convencer o Secretário da Casa Civil, Regis Fichtner, a fazer as mudanças.
Fichtner estará presente em uma audiência pública no dia 8 de novembro, justamente para discutir a política de concessão do Maracanã. Os alunos, pais e professores da Escola Municipal Friedenreich estarão presentes. Eles estão muito unidos, mas ainda estão desamparados e precisam de toda a ajuda dos cariocas. Não vamos deixar que eles entrem nessa audiência pública sozinhos! Pra juntar a sua voz à deles, assine a carta de apoio!
p.s: antes de conhecermos a Bia, a história da escola já havia sido enviada pra nossa equipe por uma mãe de aluno, Márcia Fernandes. Ela nos contou que justificativas diferentes já foram dadas para a demolição: primeiro, era para construir um estacionamento, agora é para as quadras. Márcia já resiste à demolição há dois anos, e não vai parar agora. Junte-se a ela aqui.
Porque o Meu Rio entrou nessa campanha?
O Meu Rio sempre defende processos participativos e transparentes nas políticas públicas, e nesse caso nenhum dos dois princípios foi respeitado. Não apenas os pais e alunos descobriram pela imprensa que sua escola seria demolida, como a decisão foi anunciada antes de consulta com a comunidade escolar e em desacordo com a própria Secretaria Municipal de Educação. Além disso, a experiência nos mostra que promessas de "vamos construir outro antes de destruir esse" não funcionam, vide o exemplo do Autódromo, que está sendo demolido antes que os equipamentos novos sejam construídos. Em se tratando do futuro das crianças cariocas, não podemos correr esse risco.
Assine a petição clicando AQUI.
Fontes:
- Estadão - Escola top 10 do Rio será demolida, afirma edital
- Jornal Extra - Pais e alunos protestam contra demolição de colégio no Maracanã, em 2009
- Concessão do Maracanã devolverá ao estado menos de 30% do que foi investido na reforma
- Veja quais são as melhores escolas públicas do Rio no IDEB
- Vídeo com a Bia na Escola Municipal
Wikileaks: Governador de MS “zombou” de pedido de terra para os Guarani-Kaiowá
30 de Outubro de 2012, 22:00 - sem comentários ainda
Documentos vazados pelo WikiLeaks mostram que autoridades do Mato Grosso do Sul desdenharam da demanda dos indígenas; para EUA, situação é um “desastre”
O drama dos Guarani-Kaiowá, de Mato Grosso do Sul, chamou a atenção das redes sociais nas últimas semanas, mas não tem comovido as autoridades do estado, conforme demonstram documentos divulgados pelo Wikileaks.
Um comunicado diplomático de março de 2009 relata uma visita do então cônsul norte-americano no Brasil, Thomas White, ao estado. Sua comitiva manteve conversas com o governador André Puccinelli (PMDB) e outras figuras de peso, como o então presidente do Tribunal de Justiça do estado, Elpídio Helvécio Chaves Martins.
O telegrama, de 21 de maio de 2009 e endereçado ao Departamento de Estado dos Estados Unidos pelo Consulado de São Paulo, relata a visita do cônsul-geral e sua equipe ao Mato Grosso do Sul. Segundo o documento, durante os quatro dias de visita, houve reuniões com membros do governo federal e estadual, do setor privado e também com lideranças indígenas.
O telegrama revela que a ideia de que os Guarani-Kaiowá poderão ter mais terras demarcadas é vista com desdém pelas autoridades locais.
“O governador Puccinelli zombou da ideia de que a terra, num estado como o Mato Grosso do Sul, cuja principal atividade econômica é a agricultura, poderia seja retirada das mãos dos produtores que cultivam a terra há décadas para devolvê-la aos grupos indígenas”, lê-se.
Além de Puccinelli, entre os entrevistados estavam o então presidente do TJ-MS, Elpidio Helvecio Chaves Martins e o presidente da Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul, Sergio Marcolino Longen. Do outro lado da disputa, além de lideranças indígenas (os guarani Otoniel Ricardo, Teodora de Souza, Edil Benites e Norvaldo Mendes) foram ouvidos representantes de grupos que fazem a defesa dos direitos indígenas, como o procurador Federal Marco Antonio Delfino e o advogado do Conselho Indigenista Missionário Rogerio Battaglia, entre outros.
O desembargador Chaves Martins, por sua vez, ponderou, na conversa com a delegação norte-americana, que a demarcação de novas terras para os indígenas poderia ter efeitos negativos – ao contrário do que reivindica o movimento indígena.
“Chaves advertiu que as tendências ao separatismo nas comunidades indígenas – concentrando os índios em reservas expandidas – só iriam agravar os seus problemas. Dourados tem uma reserva vizinha, que Chaves previu que se tornará a ‘primeira favela indígena do Brasil’ se persistir a tendência a isolar e dar tratamento separado aos povos indígenas”, relata o cônsul.
Segundo defensores dos direitos indígenas, a reserva de Dourados tem péssimas condições de vida em função da sobrepopulação ocasionada pela falta de terras: são 11,3 mil pessoas vivendo em 3,5 mil hectares.
O então presidente do Tribunal de Justiça também reclamou de “calúnias” que as autoridades locais sofrem dos ativistas, sendo acusadas de “tortura e racismo”, quando estão simplesmente “tentando cumprir a lei”.
Segundo recentes relatórios do Conselho Indigenista Missionário, há mais assassinatos entre indígenas no Mato Grosso do Sul, e particularmente entre os Guarani-Kaiowá, do que em todo o resto do Brasil: entre 2003 e 2011, foram 279 em MS, e 224 no restante do Brasil. O estado também se destaca pelo número de suicídios entre indígenas e outras mazelas, como desnutrição infantil.
Índios deviam “aprender a trabalhar”
De modo geral, avalia o comunicado diplomático, as autoridades locais acreditam que as demandas indígenas pelas demarcações e o retorno ao estilo de vida tradicional “não têm base”.
“Autoridades municipais e estaduais perguntaram como os índios dali reivindicavam ser índios, se eles ‘usam carros, tênis, drogas’. Eles reclamaram dos subsídios públicos dados aos índios, afirmando que eles deveriam ‘aprender a trabalhar como qualquer um’”, relata ainda o telegrama.
O telegrama expressa a conclusão de que não há “solução fácil” para o conflito em Mato Grosso do Sul. Para os norte-americanos, apesar de estarem na posse das terras há décadas, somente 30 a 40% dos agricultores devem ter títulos legais no estado – a conclusão é baseada em uma estimativa do geógrafo Ariovaldo Umbelino de Oliveira, da Universidade de São Paulo.
“Era difícil ver um meio termo potencial no conflito entre índios e agronegócio em Dourados. Apesar de os índios parecerem menos radicais do que, por exemplo, o não étnico Movimento dos Sem-Terra (MST), eles parecem não menos dedicados à sua meta de recuperar suas terras ancestrais, e a oposição dos proprietários parece igualmente arraigada”, avalia o telegrama.
Para os americanos, a situação das terras indígenas em MS e outras partes continuará apresentando desafios à democracia brasileira nos próximos anos. “A única coisa que fica clara é que, sem uma postura mais proativa do governo brasileiro, o assunto não vai se resolver por si mesmo”, conclui outro comunicado de 2008 sobre o tema – intitulado significativamente de “o desastre guarani-kaiowá”.
Nas últimas semanas, uma carta da comunidade guarani-kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay (Iguatemi-MS) deflagrou uma ampla campanha de solidariedade com esse povo indígena com base especialmente na internet. A demanda básica dos Guarani-Kaiowá é pela demarcação de terras: atualmente esse povo, o segundo maior do país, soma 43,4 mil pessoas, vivendo em pouco mais de 42 mil hectares.
Na carta, os indígenas afirmam não acreditar mais na Justiça brasileira e, diante do abandono do Estado e das constantes ameaças de pistoleiros, fazem, em tom dramático, o pedido para que seja decretada a “morte coletiva” dos 170 Guarani-Kaiowá da comunidade.