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O neofeminismo e o neonazismo
19 de Maio de 2013, 21:00 - sem comentários ainda Algumas considerações a respeito do Fêmen do Brasil.Em tempos de crítica ao politicamente incorreto, certos grupos de pessoas têm tentado emplacar o termo “feminazi” para se referir aos movimentos de mulheres. O intuito é dizer que nós, feministas, somos intolerantes e autoritárias demais ao não aceitarmos piadas sobre estupro ou não engolirmos propagandas de cerveja que nos vendem como objeto.
Até agora, esse apelido não tinha colado muito.
Com todo o debate envolvendo a prisão das três ativistas do Femen BR, finalmente a tal alcunha parece ter conseguido uma brecha. Não pelo que caminho que gostaria, ou seja, de desqualificar os argumentos das feministas, mas pelo que supostamente seria o passado da porta-voz do Femen BR, Sara Winter.
Segundo especulações na internet, baseadas principalmente no blog de Winter e em seu perfil no Facebook, a moça já teria sido simpatizante da Ação Integralista Brasileira, de inspiração fascista, e de seu líder, Plinio Salgado. E seu pseudônimo seria, na verdade, uma homenagem a uma britância nazista que atuou na Segunda Guerra Mundial.
Pronto, era só o que precisavam para o termo “feminazi” ganhar força. Ou, pelo menos, para poderem fazer graça de novo com ele. “Viu só como tínhamos razão? Elas são mesmo, literalmente nazistas!”, li por aí.
Eu não vou tentar aqui defender a Sara. Não a conheço, mas não acredito que o passado seja o único instrumento para julgar alguém. Afinal, se eu não acreditasse em mudanças possíveis, minha vida e esse blog não fariam o menor sentido. Muito menos a ideia de correção da Justiça burguesa.
Agora, independentemente de seu histórico, suas declarações realmente não têm contribuído muito com a luta feministas, para dizer o mínimo. Alguns breves exemplos: 1) Ela defende as ucranianas loiras como ideal de beleza, o que soa altamente racista; 2) Ela acha que os “os seios de homem não têm utilidade nenhuma”, demonstrando um grande preconceito sexista; 3) Ela afirma que lésbicas e bissexuais são mulheres que tiveram experiências ruins com os homens e desistiram de ser heteros, algo terrível e absolutamente inaceitável, que passa por cima de qualquer respeito à orientação sexual.
E como não lembrar que os pronunciamentos do grupo aqui mencionam o Brasil com “z”, “Brazil”? E que dizem que o movimento é “apolítico”? (Não, não é “apartidário”, é “apolítico” mesmo) E que a iniciação coberta pela mídia mais parece um trote universitário cruel?
Mas, todavia, porém, não podemos jogar a criança fora com a água do banho.
O tal neofemismo que Sara clama para si – e que para mim é simplesmente o feminismo no século XXI e não precisaria de, com o perdão do trocadilho, neologismos para se definir – é uma luta política empolgante, viva e com milhares de representantes em todo o mundo.
Da Marcha das Vadias às francesas que colocam bigodes e ocupam espaços onde apenas homens heterossexuais tomam as decisões, utilizar o corpo – seja lá qual for ele – como instrumento de protesto tem sido uma arma e tanto! O bravíssimo Femen ucraniano que o diga!
( Texto publicado, originalmente, no blog Território de Maíra.)
ABI é invadida durante a madrugada
14 de Maio de 2013, 21:00 - sem comentários aindaA sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) foi invadida na madrugada desta quarta-feira (15), supostamente por assaltantes que teriam entrado no prédio, através de andaimes
Foram levados bens materiais irrisórios. Os invasores danificaram, sobretudo, o sétimo andar, onde funcionam a administração, o site da ABI, a diretoria, dois pequenos auditórios. O nono andar, onde está o auditório principal, para 800 pessoas, ficou parcialmente sem luz, além do 11º e segundo andar.
Na última hora, o lançamento do dossiê do Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do Rio de Janeiro, previsto para hoje, teve que ser transferido para o Clube de Engenharia. O evento, com apoio da ABI, foi organizado por inúmeras entidades e denuncia violações de direitos humanos no Rio de Janeiro, em consequência dos megaeventos.
O estranho assalto pode ter sido motivado em razão do empenho da ABI pela abertura dos arquivos da ditadura e apoio à Comissão da Verdade. Suspeita-se, ainda, de represália ao projeto de lei de iniciativa popular por uma mídia democrática, com participação de membros da ABI. No saguão do prédio existe uma banca de recolhimento de assinaturas em favor do projeto popular, que atende às segundas, quartas e sextas, no final da tarde. A nota oficial da ABI sobre o ocorrido está sendo aguardada a qualquer momento.
Fonte: Agência Petroleira de Notícias
O Rio que viola Direitos Humanos
14 de Maio de 2013, 21:00 - sem comentários aindaNa segunda edição do dossiê “Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de Janeiro”, Comitê Popular da Copa mostra que há pouco o que comemorar |
(Por Agência Pública)
O relatório das violações de direitos humanos divide-se em oito esferas ligadas ao interesse público: moradia, mobilidade, trabalho, esporte, meio ambiente, segurança pública, informação e participação e orçamento e finanças. Confira abaixo alguns pontos levantados pelo Comitê em cada uma delas.
MORADIA
Nada menos do que 3 mil famílias residentes na cidade do Rio de Janeiro já foram removidas por conta da realização de projetos direta ou indiretamente ligados à Copa do Mundo e às Olimpíadas. O número pode chegar a quase 11 mil famílias expulsas, já que outras 7.800 famílias correm o risco de despejo. Em relação ao primeiro dossiê, nessa segunda versão foram reunidas informações mais específicas e atualizadas de modo a demonstrar detalhadamente as violações de direitos humanos ocorridas na cidade.
As comunidades envolvidas no processo de remoção foram divididas em quatro eixos específicos relacionados ao fator de risco: as obras viárias em curso no Rio de Janeiro; as obras de instalação e reforma de equipamentos esportivos; as obras de revitalização turística da zona portuária e as áreas de risco ou interesse ambiental.
Apesar da especificidade e das peculiaridades de cada região, o dossiê aponta padrões no trato do poder público, sobretudo o municipal, com as comunidades que se vêem envolvidas no contexto de remoção. Esses são seis, presentes na ação do poder público no trato com as comunidades atingidas, segundo o comitê:
“(i) Completa ausência, ou precariedade de informação para as comunidades, acompanhada de procedimentos de pressão e coação, forçando os moradores a aceitarem as ofertas da prefeitura do Rio. Cabe frisar que as comunidades visitadas, sem exceção, não tivera acesso aos projetos de urbanização em suas áreas de moradia.
(ii) Completa ausência, ou precariedade de envolvimento das comunidades na discussão dos projetos de reurbanização promovidos pela prefeitura, bem como das possíveis alternativas para os casos onde são indicadas remoções.
(iii) As indenizações oferecidas são incapazes de garantir o acesso a outro imóvel situado na vizinhança próxima, tendo em vista que a prefeitura só indeniza o valor das benfeitorias e não a posse da terra, fato em geral agravado pela valorização imobiliária decorrente dos investimentos realizados pelo poder público. Tal situação não é revertida nem mesmo com o instrumento da compra assistida, o que gera um aumento no valor pago pelas indenizações em torno de 40%., mesmo assim insuficiente para a aquisição de um imóvel na mesma localidade. Resta a opção de transferência para um imóvel distante, nos conjuntos habitacionais que estão sendo construídos em geral na zona oeste, no âmbito do programa Minha Casa Minha Vida.
(iv) Deslegitimação das organizações comunitárias com agentes dos processos de negociação, sempre individualizados por famílias, buscando enfraquecer a capacidade de negociação dos atingidos com o poder público.
(v) Desrespeito à cidadania através de ameaças, pressão e coação.
(vi) Utilização da Justiça como ferramenta contra o cidadão. Nas ações judiciais promovidas pela procuradoria do município, o poder público tem sido “uma máquina irresponsável de despejos”, sem compromisso com a saúde e a vida das pessoas. “A prática da procuradoria do município parece ser a de castigar todos os cidadãos que recorrem à justiça para proteger os seus direitos.”
Uma comunidade que passou por um processo emblemático de remoção foi a Comunidade do Campinho. Segundo o Comitê, o primeiro contato da administração municipal com os moradores foi em janeiro de 2011. Cinco meses depois a comunidade já estava extinta. O motivo? A construção de um mergulhão do corredor Transcarioca de BRT. O dossiê afirma que houve pressão psicológica para que os moradores aceitassem um apartamento do Minha Casa Minha Vida em Cosmos, a 60 km do local. “Há relatos, com mais de uma testemunha, do recebimento de indenizações em sacos de dinheiro pagos em negociação direta com a empreiteira responsável pela obra”, diz o dossiê.
MOBILIDADE URBANA PARA QUEM?
É essa pergunta que faz o dossiê ao tratar das intervenções de mobilidade urbana que estão em curso por conta dos megaeventos no Rio de Janeiro. “A análise dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro indica que estes não estão voltados para o atendimento das áreas mais necessitadas e que apresentam os piores indicadores de mobilidade. Pior do que uma infraestrutura mal construída ou mal distribuída pelo território da cidade, constata-se que muitas comunidades têm sido removidas compulsoriamente ou sofrido ameaça de remoções por conta da construção da infraestrutura de transporte para Copa e Olimpíadas. Isto, por si só, constitui uma violação ao direito à moradia garantido em diversos tratados internacionais”, afirma.
Ou seja, além dos investimentos em mobilidade urbana beneficiarem as áreas que já contam com as melhores alternativas nesse aspecto, a população carente tem que lidar com o ônus das remoções.
“Através das propagandas oficiais e da mídia em geral, o poder público tem prometido uma ‘revolução nos transportes’, construindo as vias Transcarioca, Transolímpica e Transoeste (todas BRTs), e o metrô Lagoa-Barra (alongamento da linha 1) – todos ligados à realização da Copa e dos Jogos olímpicos. Por outro lado, a população clama por serviços de transporte de massa em outras direções e para outras regiões da cidade. Ou seja, enquanto hoje o serviço de transporte coletivo oferecido à população se configura como caro, precário e insuficiente para a demanda existente, o cenário que se desenha para o futuro é o de investimentos em transporte que, ao invés de atenderem à demanda existente, tornam possível a ocupação de áreas vazias ou pouco densas, visando e promovendo a valorização imobiliária e a expansão irracional da malha urbana”, analisa o documento do Comitê Popular. O dossiê também aponta para uma forte concentração dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro, em detrimento das outras 20 cidades que compõe a área metropolitana da capital; dentro da capital, os investimentos estão maciçamente direcionados à Barra da Tijuca e à zona sul, as áreas mais nobres do Rio.
Destaca-se também os constantes aumentos das tarifas de transporte.
TRABALHO
Tido como um dos grandes fatores legitimadores da realização dos megaeventos, o impacto da Copa e das Olimpíadas no trabalho é analisado pelo dossiê do Comitê Popular.
O primeiro aspecto apontado pelo comitê é que nas obras ligadas aos megaeventos é comum ocorrer a chamada precarização do trabalho. Prazos exíguos, omissão de fiscalização pelos órgãos públicos competentes, o contexto de exceção que permite licitações feitas a toque de caixa, além das pressões exercidas por órgãos como o COI e a FIFA ajudam a criar este cenário. Só o Maracanã, aponta o dossiê, já passou por duas paralisações relacionadas a condições de trabalho.
A repressão ao comércio informal também se agravou no contexto dos megaeventos, afirma o Comitê. Segundo documento da Streetnet International, articulação de coletivos de vendedores informais de todo o planeta, há 60 mil vendedores ambulantes trabalhando no Rio de Janeiro em risco por conta da realização dos jogos. Os ambulantes não poderão se beneficiar do contexto da Copa e das Olimpíadas, uma vez que estão proibidos de trabalharem próximos aos locais vinculados às competições. “Também está prevista a repressão, com prisão e apreensão de mercadorias, de qualquer pessoa que comercialize material que faça referência aos símbolos dos eventos e de seus patrocinadores. Nessa mesma direção, está proibida a venda de qualquer souvenir dos eventos aos turistas produzido pelos trabalhadores informais. Ou seja, só poderão vender mercadorias com símbolos dos eventos as empresas licenciadas pela FIFA e pelo COI”, diz o texto. Isto está inclusive garantido pelo artigo 11 da Lei Geral da Copa (12.663/2012).
ESPORTE
“O futebol no Brasil está vivendo um momento bastante complicado. Os estádios históricos estão sendo destruídos para renascer em forma de centros de consumo e turismo, por vezes com jeito de shopping-center. Os ingressos dos campeonatos nacionais e estaduais estão cada vez mais caros, fora do alcance do torcedor ‘tradicional’. A média de público nos estádios está em plena queda”, analisa o dossiê do Comitê Popular.
A concessão do Maracanã, com a consequente demolição de praças esportivas essenciais como o Parque Aquático Júlio Delamare, o Estádio de Atletismo Célio de Barros e a consolidação do projeto olímpico na Barra da Tijuca são os principais fatores contestados pelo dossiê.
A chamada elitização do público do futebol também é destacada pelo dossiê. “Percebe-se um decréscimo de 732.160 torcedores nos estádios da primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol, entre 2011 e 2012, o que representa uma queda de 13%. Ao mesmo tempo, os custos dos ingressos subiram 9% e a arrecadação geral aumentou em 3%. Esses números podem indicar que menos brasileiros têm acesso aos estádios. Isso pode estar ocorrendo em função das obras, em andamento nos grandes estádios visando a Copa do mundo nas principais cidades do país, como é o caso do Rio de Janeiro”, aponta o documento.
Segundo o Dossiê, é possível analisar esse contexto como o de imposição de um modelo de futebol empresarial. Nele “estimula-se a venda do espetáculo aos ‘clientes’, que vão aos estádios para ter uma experiência de entrenimento e não uma participação ativa, identitária e afetiva com o evento. Sem dúvida, os números indicam que os que frequentam os estádios desembolsam cada vez mais dinheiro”.
Além disto, destaca-se também a destruição do legado do Pan-2007 pelo projeto das Olimpíadas de 2016 como ocorreu com o Velódromo, o Parque Aquático Maria Lenk e, mais recentemente, o estádio do Engenhão.
MEIO AMBIENTE
O documento aponta que, apesar do discurso oficial afirmar veementemente a preocupação ambiental, na prática ocorre o inverso. A construção dos corredores viários Transcarioca, Transolímpica e Transoeste são alguns exemplos.
No caso do primeiro projeto, por exemplo, o dossiê critica o aterramento da lagoa de Jacarepaguá. Estavam previstos, para mitigar o efeito do aterramento, dois programas pelo estado do Rio: o Programa de Monitoramento da Fauna Existente e o Programa de Compensação Ambiental. Nenhum deles foi realizado.
SEGURANÇA PÚBLICA
“No Rio de Janeiro, que vem servindo de laboratório no tema da segurança pública, defende-se a necessidade de medidas extraordinárias de segurança. Mas cabe perguntar o que está sendo segurado, como, onde, e quais serão os efeitos de curto, médio e largo prazo das medidas que estão sendo adotadas”, pontua o dossiê.
Os fatos de a segurança durante os jogos ser feita por agentes privados contratados pela FIFA, bancados com dinheiro público, de o governo brasileiro pretender investir R$ 80 milhões em câmeras de vigilância nos estádios e não haver garantias de que as imagens coletadas pela FIFA sejam apagadas depois do evento, são criticados. O dossiê também vê essas ações como pretexto para aprofundar a mudança do modelo de segurança pública para o predomínio da segurança privada.
“Como um experimento para controlar as massas e extirpar ameaças, os megaeventos deixarão um saber governamental sobre as novas configurações da cidade. Esse saber não é neutro ou despolitizado, mas contextualizado dentro de um complexo cultural que identifica ameaças particulares que são socialmente construídas. A montagem do aparelho para proteger os interesses associados aos megaeventos pode ser adotada e utilizada para proteger os mesmos interesses pós-evento”, afirma o Comitê.
INFORMAÇÃO E PARTICIPAÇÃO
O Comitê destaca ainda a negligência com respeito ao direito à informação e participação popular nos assuntos de interesse público durante os preparativos da Copa. Como exemplo, cita as remoções ocorridas nas comunidades Vila Harmonia, Recreio II, Restinga, Sambódromo, Campinho e Metrô-Mangueira. Todas as comunidades foram avisadas das remoções de suas casas algumas horas antes do despejo. E diz que não houve apresentação de justificativas plausíveis em grande parte das remoções nem os detalhes dos projetos foram publicados.
No aspecto orçamentário aponta também falta de transparência. “A divulgação de aumento de gastos frequentemente ocorre muito tempo após ter sido efetuado e, mesmo assim, nem todos os valores são publicados. No caso da preparação para os Jogos Olímpicos, há apenas uma estimativa inicial de orçamento constando no dossiê de candidatura, mas os gastos poderiam efetivamente alcançar quase o dobro dessa estimativa, segundo depoimento do presidente da Autoridade Pública Olímpica, em 2012.”
ORÇAMENTO E FINANÇAS
O dossiê chama atenção para o valor total de investimentos para a realização da Copa do Mundo no Rio de Janeiro, que já sofreu um aumento de 95% tendo como base os valores da Matriz de Responsabilidades. Os R$ 2,2 bilhões previstos inicialmente tornaram-se quase R$ 4,2 bilhões. E contesta a informação de que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro em 2016 custarão cerca de US$ 12,5 milhões, elencando 21 projetos municipais ligados, ao menos no discurso, às Olimpíadas cuja soma de orçamento alcança nada menos do que R$ 22,6 bilhões.
“Chama atenção o fato das decisões relativas a esses investimentos não passarem por uma ampla discussão democrática, envolvendo todos os segmentos sociais, colocando em pauta o projeto de cidade que está construído”, conclui o documento, criticando, mais uma vez, a concentração de investimento público em áreas nobres.
O blog Copa Pública é uma experiência de jornalismo cidadão que mostra como a população brasileira tem sido afetada pelos preparativos para a Copa de 2014 – e como está se organizando para não ficar de fora.
1963: Dos Rolling Stones ao Dr. Strangelove, um ano de convulsão social e cultural
14 de Maio de 2013, 21:00 - sem comentários ainda1963: Dos Rolling Stones ao Dr. Strangelove, um ano de convulsão social e cultural |
O The Guardian publicou uma série de artigos sobre o ano de 1963, cinquenta anos depois. A seguir, o olhar do escritor paquistanês-britânico Tariq Ali sobre a extraordinária colisão de políticas, cultura e convulsão social que testemunhou enquanto estudante.
Por Tariq Ali
Será que foi um ano profético? Acho que sim. Não que se tenha pensado nisso na altura ou mesmo alguns anos mais tarde, quando já tudo estava totalmente esquecido na turbulência que tomou conta do mundo. Vou tentar relembrar esse ano, encontrar bem fundo algumas memórias, mesmo algumas impressões com base nas quais poderei reconstruir um passado embaciado sem muitas distorções.
Quando em Outubro de 1963 cheguei a Oxford para estudar, o estilo boémio, para as mulheres, eram casacos de plástico preto ou de couro, e casacos de couro preto ou samarras azul marinho para os homens. Eu fiquei-me pelos tecidos de sarja e um casaco acolchoado, pelo menos durante alguns meses. A crise dos mísseis cubanos tinha impulsionado temporariamente a CND (Campanha para o Desarmamento Nuclear); a Conferência do Partido Trabalhista inicialmente tinha votado pelo desarmamento nuclear unilateral em 1960, mudando de ideias de novo no ano seguinte, fortemente influenciada pela recusa no leito de morte do ícone de esquerda Aneurin Bevan de “ir nu para a câmara da conferência”. Bertrand Russel achou que a CND era muito moderada e demitiu-se para criar a sua prole de ação direta, o Comité dos 100.
A conversa era sobre os Beatles. Aqueles que tinham estado nas salas da assembleia de Carfax naquele fevereiro para os ouvir, ficaram enfeitiçados. Mesmo assim, havia enormes discussões nas festas entre os simpatizantes dos Beatles e aqueles de nós que pensávamos que os Rolling Stones eram simplesmente superiores, sem dúvida mais emocionantes, mais sensuais e tinham melhor música para dançar. Numa dessas festas em que votámos com qual das músicas iríamos dançar, as mulheres, com algumas exceções, preferiram os Quatro Fabulosos. Os “homens de verdade” queriam os Stones.
Bob Dylan também estava na moda. O seu álbum “The Freewheelin’ Bob Dylan” tinha acabado de ser lançado e “Mr. Tambourine Man” serviu de cenário para uma quantidade enorme de trocas de olhares, um prelúdio para a sedução ou não, como acontecia com frequência. A pílula tinha mudado as atitudes e dado à mulher muito mais liberdade, mas a discriminação era terrível. Foi Judith Okely (Jude the Baptist), acabada de sair da Sorbonne, que defendeu a tese sobre o feminismo e apresentou a alguns de nós o trabalho de Simone de Beauvoir.
Nesse mesmo ano, Dylan mudou-se com Suze Rotolo para o Village. Os pais de Suze eram comunistas que tinham sobrevivido a McCarthy. Juntos radicalizaram Dylan. O resultado foi “The Times they are a-Changin’” (1964), que ajudou a impulsionar o movimento dos direitos civis e a radicalizar estudantes que tinham depositado grandes expectativas no Presidente Kennedy, mas em vez disso houve a invasão da Baía dos Porcos e o Vietname, e mais tarde Lyndon B. Johnson. Em agosto, o discurso de Martin Luther King “I had a dream” eletrizou uma geração completa. Quase um século após a guerra civil americana, os afro-americanos estavam a ser linchados, os direitos humanos fundamentais a serem-lhes negados, não poderem registar-se para votar na maioria dos Estados do sul, e foram discriminados no norte. A Ku Klux Klan tinha apoiantes tanto no Partido Republicano como no Democrático. Então decidiram retaliar: pacificamente se pudermos, disse o Dr. King: violentamente se for necessário, respondeu Stockely Carmichael e Malcolm X.
Há uma memória que é bem clara – 22 de novembro de 1963. Estou sentado na sala da TV do União de Oxford a ver as notícias da manhã com um grupo de amigos. De repente, ficatudosombrio. Vemos as filmagens em silêncio. John F. Kennedy tinha sido assassinado. Nenhum de nós fala. Dirigimo-nos ao bar. A primeira pessoa que encontro é uma jovem bonita de pequena estatura, de rosto pálido e cabelos encaracolados, chamada Judith G, um braço forte do clube comunista. “Kennedy foi assassinado.” Ela olha-me sem qualquer expressão no rosto. “Ah, pois é. Também apanharam Lyndon Johnson?” Sempre foi muito boa a chamar a atenção.
O debate sobre quem ordenou o atentado começou imediatamente no dia a seguir e o problema continua por resolver. Três meses mais tarde, a brutal obra de arte de Stanley Kubrick, Dr. Strangelove chega aos ecrãs, que representa o Pentágono sob o controlo de loucos que preparam um holocausto nuclear, com Peter Sellers no papel de um presidente preocupado. No início desse ano, o economista americano James Galbraith, cujo pai, JK Galbraith, era amigo intimo de Kennedy, tinha-me dito que “em minha casa, Dr. Strangelove sempre foi visto como um documentário.” Alguns dos generais eram extremamente insolentes, alguns simples paranóicos.
Noutros lugares, outros dirigentes desmoronavam. Harold Macmillan (Inglaterra), Konrad Adenauer (Alemanha Ocidental), David Ben-Gurion (Israel) foram todos derrubados por escândalos de um ou outro tipo, geralmente envolvendo sexo e/ou segurança do estado. Neste aspeto as coisas não mudaram muito. Apesar do espírito de 1945, a Inglaterra mantinha uma sociedade de classes fortemente dividida onde a deferência para com os “superiores” dominava a cultura política. O novo dirigente Trabalhista, Harold Wilson, acabou por ser um excelente líder da oposição, ao desafiar, zombar e invalidar as pretensões dos Conservadores em todas as frentes.
No entanto, quem liderava a corrida para a modernidade eram os cineastas, os dramaturgos e os críticos. A televisão, um meio de comunicação relativamente novo, era frequentemente visto em coletividades, pois nem todas as casas possuíam um aparelho. Nos Estados Unidos, um professor de matemática de Harvard, Tom Lehrer, divertia a classe média liberal com as suas canções de zombaria (parou de cantar quando o Nobel da Paz foi atribuído a Kissinger porque “já não se podia criticar”). Foi acompanhado por Lenny Bruce, um dos mais brilhantes e loucos cómicos vistos em palco: a sua corrente de consciência delirantemente incoerente foi considerada subversiva e ele foi preso por “obscenidades” em São Francisco e ficou permanentemente impedido de entrar em Inglaterra após um bem-sucedido show no Clube de Peter Cook em 1962.
Em Inglaterra, apareceu Private Eye e a BBC (na altura ainda não totalmente neutra) passava “That Was the Week that Was” (TW3), vista por 10 milhões de espetadores semanais, com atuações de David Frost e Willie Rushton e Dennis Potter, Peter Cook, Richard Ingrams, John Cleese etc que ajudavam a escrever as piadas.
Foi no Scala em Walton Street em Oxford (mais tarde a Academia em Oxford Street, e Hampstead Everyman) onde se podia ver o mais recente do cinema Europeu. A minha primeira experiência foi educativa. Depois de uma exibição de Andrzej Wajda (Ashes and Diamonds) “Cinzas e Diamantes” no Scala, tocaram God Save the Queen. Sem pensar, levantei-me como costumava fazer em Lahore quando o hino nacional era tocado, para ser cumprimentado, de imediato, por um coro em uníssono da fila de trás: “Senta-te seu fascista!”. O erro nunca mais foi repetido. A nova vaga francesa foi uma revelação. Só os filmes de Jean Luc Goddard atingiram-nos como balas, cuja carga não era maior do que ler um romance de Stendhal – Le Mépris, Bande à part,Une Femme Mariée, Pierrot le Fou, Deux ou Trois Choses, La Chinoise. O fim de semana dominou a década. Não que a indústria cinematográfica britânica estivesse morta. Longe disso. A parceria Joseph Losey/Harold Pinter deram-nos The Servant, uma representação poderosa da repressão de classes e sexual (a homossexualidade só foi legalizada em 1967) com imagens surpreendentes que fizeram do filme um clássico. Billy Liar de John Schlesinger, Tom Jones de Tony Richardson e This Sporting Life de Lindsay Anderson foram todos percursores do que estava para vir.
A primeira peça que vi neste país foi Oh What a Lovely War de Joan Littlewood, uma homenagem comovente à cultura do music hall e Brecht, “cujo trabalho bem conhecíamos desde os anos 1930”, explicou ela. Foi uma desconstrução feroz da primeira guerra mundial e deveria ser exibida outra vez no ano seguinte em alternativa à taxa centenária que vamos ter. O Royal Court era o teatro mais animado de Londres, combinando Beckett e Ionescu e comissionando novas peças sem parar. O Zelador de Pinter estreou nesse ano e Peter Brook, um grande admirador de Littlewood, estava imerso em trabalho que iria desafiar todas as convenções teatrais.
A cultura refletiu uma autoconfiança crescente nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial. Alguns dos meus amigos universitários estavam em revolta contra tudo: professores, exames, instituições, e até a própria vida. Perseguiam o mundo, procurando-o para logo o rejeitarem, largando-o. Muito em breve iriam entrar no seu próprio mundo.
Aquilo para que eu não estava preparado em 1963 era a comida. Era horrível, com a exceção do pequeno almoço. Após a minha primeira semana, aventurei-me a ir ao restaurante indiano local, imaginativamente chamado o Taj Mahal. Terrível. Chamei o gerente e perguntei-lhe porque razão a comida que não nos atrevíamos a dar aos cães estava a ser servida naquele local. Ele ficou muito aborrecido e levou-me até ao escritório. “Vocês acabam de chegar? Então por favor não voltem a pôr aqui os pés. Há uma senhora de Punjab que cozinha comida adequada todos os fins de semana no norte de Oxford. Podem até encomendar com antecedência.” Os meus amigos ingleses ficaram surpreendidos. “Então é assim que isto é?” A curto prazo, isto salvou-me, mas tive de aprender a cozinhar, o que consegui, e nunca me arrependi. Nada sugeria que 30 anos mais tarde este país viria a ser conhecido pelos seus restaurantes e boa comida. Milagres até acontecem.
Nota de rodapé. Em 1965, um ano depois da eleição de um governo trabalhista que não cumpriu muitas das suas promessas, Michael Foot gritou-nos em desespero quando denunciamos o seu dirigente, Wilson, por “rastejar até ao Pentágono”. “Idiotas” gritou. “Não entendem que Wilson é o primeiro-ministro mais esquerdista que este país alguma vez irá ter?” O nosso riso satírico enraiveceu-o. Agora já não nos rimos. Passados 50 anos, a globalização provinciou a política e a cultura europeias. A Inglaterra já não tem indústria cinematográfica. Até mesmo Ken Loach recebe a maior parte do seu dinheiro da Europa, que por sua vez se limita a imitar os thrillers de Hollywood e filmes de ação, o seu orgulhoso cinema está efetivamente morto; o seu olhar literário voltado para a lista dos bestsellers de NYC, os seus escritores obcecados em ser traduzidos para o inglês-americano; os seus políticos repetindo os ritmos tweedledum-tweedledee pioneiros em DC. Os filmes mais interessantes estão a ser feitos pelos cineastas do Irão, da Coreia do Sul, de Taiwan e da Tailândia, as políticas mais desafiantes estão na América do Sul, o centro do mercado mundial mudou-se para o leste, a China. Mas não se preocupem. A América do Norte e a Europa ainda dominam a indústria do armamento. Com os drones a dominarem a política e a cultura, porque não seriam também os bestsellers do mercado de armas?
7 de Maio de 2013
Tradução de Noémia Oliveira para o Esquerda.net
Cartão vermelho de Deus - As rapidinhas do Sr Comunica
13 de Maio de 2013, 21:00 - sem comentários aindaCartão vermelho de Deus - As rapidinhas do Sr Comunica |
Em 1995 ingressei na PUC de Campinas, no curso de Psicologia. Por considerar o reajuste de uma mensalidade ilegal, um grupo de alunos, incluindo eu, entrou com um processo na justiça. Em 1996, com dificuldades financeiras pessoais, entrei na fila dos devedores para renegociar meus débitos com a Instituição Filantrópica de Ensino Superior, a Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP).
Não me esqueço desse dia: na minha frente, duas garotas parcelaram seus débitos em 10 vezes, sem mais problemas além dos burocráticos. Eu, que havia entrado com um processo contra a Instituição, tive meu pedido de parcelamento negado.
Não havia debate lógico ou argumento coerente que resolvesse o caso. Certamente, a ordem "veio de cima" (não de Deus, acredito eu), para não negociar minha dívida. O próximo passo foi tentar falar com o coordenador financeiro (ou semelhante cargo), para tentar resolver o caso.
Seu nome também não esqueço: N.... (prefiro manter seu nome em sigilo). Eu, acompanhado de minha mãe, fomos até a sala dele para fazer a negociação. Havia uma mensalidade paga em juízo, no valor considerado correto e causa do processo. Durante a negociação, o Sr. N...., cujo sorriso me parecia sarcástico e desafiador, fez uma única proposta de renegociação da dívida. Minha mãe estava quase aceitando, mas eu disse em alto e bom som: "não".
O funcionário da instituição católica e filantrópica de ensino superior, ao recalcular o parcelamento da minha dívida, embutiu o valor do reajuste que estávamos contestando na justiça. Quando apontei o "engano" no cálculo, que obviamente era má-fé, ele me disse uma frase que também não esqueço, alternando o olhar e falando vagarosamente: "mas este moleque é um filho da... (pausa), senhora" - finalizou olhando para minha mãe.
Para resumir, ele foi inflexível. Não queria refazer o cálculo e eu me neguei a pagar injustamente um valor que estava sendo contestado judicialmente. Na época, eu e os outros alunos assinamos uma procuração, dando plenos poderes ao advogado para nos representar na ação. Nunca mais ouvi falar do advogado, do processo ou de créditos ou débitos que possam existir (aliás, se algum advogado se habilitar em ajudar, gostaria de saber o que aconteceu, se é que aconteceu). Aliás, creio eu, que não houve nenhum débito, caso contrário, certamente eu seria encontrado e notificado.
Na época, estava passando por um momento pessoal muito delicado, repleto de complicações, e por toda a circunstância envolvida, decidi abandonar a faculdade. Perdi tudo o que já havia cursado e somente cerca de dez anos depois, consegui reingressar em outra Instituição de Ensino Superior, desta vez, no Rio de Janeiro, onde me formei em Jornalismo no ano passado.
Este assunto pessoal só voltou a povoar minha mente por conta de uma notícia que li no Congresso em Foco: Justiça manda cobrar quase R$ 1 bi de filantrópicas. A matéria pode ser lida ao clicar no link. O fato é que a Justiça mandou cobrar de várias instituições filantrópicas cerca de R$ 1 Bilhão. Dentre elas, a Pontifícia Universidade Católica de Campinas, a Puccamp, que deve cerca de R$ 240 milhões em impostos não pagos para a União. Além disso, estas entidades são suspeitas de irregularidades ou mesmo fraudes detectadas pela Polícia Federal.