Das mortes por conflito de terra em 2018, 57% foram no estado. Em 40 anos, 53 líderes camponeses foram mortos. |
Por Igor Carvalho, no Brasil de Fato
Após o assassinato de Carlos Cabral Pereira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) de Rio Maria, no Pará, na última terça-feira (11), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultores (Contag) demonstraram preocupação com a violência no estado.
O relatório “Conflitos no Campo” de 2018, da CPT, informa que, dos 28 assassinatos cometidos por conflito de terras no Brasil, 16 casos (57%) ocorreram no Pará. Os números preocupam Dom André Witte, presidente nacional da entidade, que lamenta a “divisão entre trabalhadores rurais e grandes fazendeiros na região.”
“Da maneira como a realidade se apresenta no Pará, motiva a necessidade de uma reforma agrária, pois garante também aos pequenos o direito e aquilo que é necessário para viver dignamente no campo. Então, tem uma situação de oposição. Vemos que a violência e a sua pior forma, a morte, acontece ao lado dos pequenos, que lutam por seus direitos, que não são atendidos”, afirma Witte.
Ainda de acordo com a CPT, nas últimas quatro décadas ocorreram 53 execuções de lideranças dos camponeses no território paraense, entre sindicalistas, religiosos, advogados ou ambientalistas. No mesmo período, houveram 49 massacres no país, 28 no Pará.
Para a entidade, o discurso bélico do governo federal pode influenciar no clima de tensão. “Os históricos conflitos pela posse da terra na região se agravaram ainda mais com as decisões do governo Bolsonaro de suspender a tramitação de todos os processos de desapropriação, compra e arrecadação de terras públicas para assentar novas famílias e de incentivar os fazendeiros a se armarem para expulsar as famílias sem terra das propriedades em conflito”, afirmou a CPT em nota.
Os números de 2018 no Pará, apresentados no relatório “Conflitos no Campo”, mostram que a violência tem se tornado um recurso comum no estado. Foram 177 conflitos por terra, que geraram 20 casos de tortura, 24 agressões, 50 ameaças de morte e 10 tentativas de execução.
O Atlas da Violência 2018, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), aponta que cinco dos vinte municípios mais violentos do país estão no Pará: Marabá, Ananindeua, Castanhal, Marituba e Altamira.
Aristides Santos, presidente da Contag, alertou para os índices do estado. “Estamos preocupados não só com essa coincidência (três presidentes do STTR assassinados em 34 anos), mas com todo o histórico de violência no estado do Pará, que é algo de uma gravidade imensa, que o Estado brasileiro precisa se preocupar e dar uma resposta para a sociedade. A Contag espera que as investigações possam andar rapidamente, para que possamos ter um desfecho desse caso, de mais esse assassinato”, explicou Santos.
Witte lamenta a atual conjuntura política que aponta para “mais perdas para os trabalhadores”. “É dentro dessa perspectiva que a gente analisa a realidade do que está acontecendo, que é dolorosa, que deveria motivar uma atitude na organização da sociedade para garantir aos trabalhadores as condições para trabalhar. As propostas vão sempre na direção de diminuir o que já tem”, encerra o presidente da CPT.
Entenda o caso Carlos Cabral, de 58 anos, presidente da STTR, voltava para sua casa por volta das 16h20 e foi emboscado na avenida Oeste, no bairro do Planalto, por dois homens em uma moto. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Pará afirma que ambos utilizavam capacete, dificultando o reconhecimento de suas identidades. Três tiros atingiram o sindicalista, dois na cabeça. Ainda na noite do assassinato, o corpo foi submetido à perícia no município de Marabá.
“Policiais civis do Núcleo de Apoio à Investigação de Redenção (NAI), da Delegacia de Conflitos Agrários de Redenção (DECA), da Superintendência Regional do Alto Xingu e da Delegacia de Xinguara foram deslocados ao município para dar suporte às investigações”, afirma a Secretaria de Segurança Pública do pará em nota.
Histórico de mortes
Em 18 de dezembro de 1985, o trabalhador rural e militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) João Canuto, foi brutalmente assassinado com 12 tiros. Dois fazendeiros da região foram julgados e condenados pelo homicídio: Adilson Carvalho Laranjeira, prefeito de Rio Maria na época, e Vantuir Gonçalves.
Quase seis anos depois, em fevereiro de 1991, o sucessor de João Canuto na presidência do STTR, Expedito Ribeiro de Souza, também foi assassinado. O mandante foi o fazendeiro Jerônimo Alves do Amorim, condenado a 19 anos de prisão.
O Brasil de Fato tentou contato com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará para apurar mais detalhes do atentado sofrido por Carlos Cabral. Porém, até o fechamento desta matéria, não houve retorno.
Edição: Rodrigo Chagas
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