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3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.

João Pedro Stedile: “Nós temos que retomar o trabalho de base”

29 de Outubro de 2018, 16:51, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso

Liderança do MST fala sobre quais são os próximos passos da esquerda após vitória de Jair Bolsonaro

“Saímos desse processo aglutinados, com capacidade e força organizada para resistir à pretensa ofensiva fascista”. A afirmação é de João Pedro Stedile, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), sobre o resultado das eleições presidenciais.

Em entrevista à Rádio Brasil de Fato logo após a vitória de Jair Bolsonaro (PSL), Stedile ressaltou que apesar da derrota eleitoral, a vitória política é do campo progressista, que criou uma forte unidade nas últimas semanas. Na sua opinião, o governo Bolsonaro, com início em 1º de janeiro de 2018, deverá se assemelhar ao governo Pinochet, no Chile, devido a sua natureza fascista.

“É um governo que vai usar todo o tempo a repressão, as ameaças, o amedrontamento. Vai liberar as forças reacionárias que estão presentes na sociedade. Por outro lado, ele vai tentar dar liberdade total ao capital em um programa neoliberal. Porém, essa fórmula é inviável, não dá coesão social e não resolve os problemas fundamentais da população”, diz Stedile.

Confira a íntegra da entrevista.

O que dizer para as mais de 46 milhões de pessoas que votaram no candidato Fernando Haddad, apoiado pelo MST?

Ainda estamos no calor dos resultados e precisamos, acima de tudo, ter muita serenidade e entender o contexto da luta de classe e não nos considerarmos derrotados por esse resultado. Ainda que as urnas tenham dado legitimidade ao Bolsonaro, não significa que ele teve a maioria do apoio da população. Há um alto índice de abstenção, 31 milhões. O Haddad teve 45 milhões. Só ai são 76 milhões de brasileiros que não votaram no Bolsonaro.

Portanto, a sociedade brasileira está dividida. Mesmo o resultado eleitoral, do que eu pude acompanhar já nas pesquisas anteriores, ficou claro que quem está apoiando o projeto do Haddad é quem ganha menos, de dois a cinco salários mínimos. Quem tem até o ensino fundamental, e claramente, os mais ricos e abastados, votam no Bolsonaro.

Mas também houve uma divisão eleitoral clara, geograficamente. Quando olhamos para o mapa do Brasil com os governadores eleitos, temos 12 candidatos progressistas do campo popular que vai desde o Pará até o governador Renato Casagrande (PSB) no Espírito Santo. O Nordeste e aquela parte da Amazônia são um polo de resistência geográfico que demonstram claramente que aquela população não quer seguir os rumos do projeto fascista de Bolsonaro.

Por último, como um breve balanço, como todos estão comentando, além do que o resultado eleitoral, a última semana consagrou uma vitória política da esquerda e dos movimentos populares. Tivemos inúmeras manifestações de todas as forças organizadas. Sindicatos, intelectuais, estudantes, universidades.

Nunca antes na história do Brasil tínhamos colocado mais de 500 mil mulheres em todo o Brasil, em 360 cidades, que foram as ruas para dizer “Ele não”, “Fascismo não”, de maneira que eu acho que o balanço não é de uma derrota política, nós sofremos uma derrota eleitoral, mas saímos desse processo aglutinados, com capacidade e força organizada para resistir com a pretensa ofensiva fascista.

Apesar dos bravateios de Bolsonaro, sabemos que no campo institucionais, há limitações. Ele já disse que tem a intenção de tipificar o MST e o MTST como organizações terroristas. Enxerga a possibilidade real e institucional que isso realmente aconteça?

Eu acho que o governo Bolsonaro vai se assemelhar, se fizermos um paralelo, com que foi o governo Pinochet no Chile. Não pela forma que chegou, mas pela sua natureza fascista. É um governo que vai usar todo o tempo a repressão, as ameaças, o amedrontamento. Vai liberar as forças reacionárias que estão presentes na sociedade. Por outro lado, ele vai tentar dar liberdade total ao capital em um programa neoliberal. Porém, essa fórmula é inviável, não dá coesão social e não resolve os problemas fundamentais da população.

O Brasil vive uma grave crise econômica que é a raiz de todo esse processo, desde 2012 o país não cresce. Portanto, ao não crescer, ao não produzir novas riquezas, os problemas sociais, econômicos e ambientais só vão aumentando.

Ele com seu programa ultraliberal, de apenas defender os interesses do capital, pode até ajudar os bancos, fazer com os bancos continuem tendo lucro, pode ajudar as empresas transnacionais para que tomem de assalto o resto do que nós temos aqui, porém, ao não resolver os problemas concretos da população de emprego, de renda, de direitos
trabalhistas, de previdência, de terra, de moradia, isso vai aumentando as contradições.

Isso irá gerar um caos social que permitirá aos movimentos populares retomar a ofensiva, as mobilizações de massa. E, no fundo, além do que está na Constituição, coisa que ele não vai respeitar muito, o que vai nos proteger, não é corrermos para debaixo da tenda. O que vai nos proteger é a capacidade de aglutinar o povo, seguir fazendo lutas de massas na defesa dos direitos, na melhoria das condições de vida e essas mobilizações populares é que serão a proteção aos militantes, aos dirigentes. Não nos assustemos. As contradições que eles vão enfrentar serão muito maiores do que as possibilidades deles reprimirem impunemente.

Há uma outra luta, que tem relação com as eleições, que desde que começou a campanha eleitoral ficou em segundo plano: a prisão ilegal e injusta do ex-presidente Lula. Qual é a perspectiva dos movimentos populares pra essa outra frente de batalha?

Como todos nós acompanhamos ao longo desse período, o presidente Lula foi sequestrado pelo capital por meio de um Poder Judiciário completamente servil a esses interesses. Ele foi preso ilegalmente. Há muitos outros, não só políticos como cidadãos, que estão respondendo em liberdade, até que se cumpra a Constituição, que só permite a prisão depois que o processo passa por todas as instâncias.

No caso do Lula, ainda falta ser julgado no STJ e depois no STF. Depois não deixaram ele concorrer quando o registro da candidatura foi feito. Outros 1400 candidatos concorreram na mesmas condições do Lula mas a ele foi proibido, e finalmente, o proibiram de falar, quando qualquer bandido de quinta categoria pode dar entrevista na Globo. Ficou famoso aquele caso do ex-goleiro do Flamengo que todo dia estava na Globo só para dar audiência. E ao Lula foi proibido se comunicar com o povo. Na verdade, eles sabiam que o Lula é a principal liderança popular que aglutinaria amplas forças do povo brasileiro, que levaria pro debate a discussão de projeto. É evidente que parte dos eleitores do Lula, que acreditam no Lula, são trabalhadores enganados por uma campanha de mentiras, que acabaram votando no Bolsonaro.

Para a esquerda e movimentos populares, temos um desafio enorme daqui pra frente de organizar comitês populares em todo Brasil, organizar um verdadeiro movimento de massas, e organizar uma verdadeira campanha internacional por sua libertação e pela designação do Prêmio Nobel da Paz no ano que vem, como é a campanha encabeçada pelo [vencedor do] Prêmio Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel.

Vamos ter uma tarefa enorme de organizar esses comitês e transformar a luta pela campanha com uma bandeira popular. Evidentemente haverá outros desafios que nós, da esquerda e movimentos populares teremos que nos debruçar no próximo período para nos aglutinarmos como vem sendo já sugerido que temos que transformar a Frente Brasil Popular, a Frente Povo Sem Medo, quem sabe nos juntarmos todos, em uma Frente Popular pela Democracia e Antifascista.

Poderia ser um instrumento mais amplo ainda do que a própria Frente Brasil Popular. Temos muita luta pela frente. A luta de classes é assim. É muito parecida com um jogo de futebol em um longo campeonato. Tem domingo que se perde uma partida, tem outro em que se ganha. Mas o fundamental é ir acumulando força e organizando nosso povo. É isso que muda correlação de forças.

Como a esquerda sai dessa batalha? Os partidos, movimentos, o próprio Fernando Haddad?

Eu me envolvi pessoalmente, o nosso movimento e a Frente Brasil Popular, e se notou claramente, nas últimas duas semanas, um novo alento, uma nova interpretação para o que está acontecendo no Brasil. Muita gente se mobilizou independente de partidos e movimentos, ou seja, há energias na sociedade e conseguiremos resistir ao fascismo.

Agora, não podemos cair no reducionismo da vida partidária e ficar nas especulações do que acontecerá com fulano ou beltrano. As pessoas pouco importam nesse processo. A luta de classes, é de classes, e portanto, é a dinâmica da luta de classes que altera a correlação de forças, que vai resolver os problemas do povo. No meio dessas lutas de classe, vão surgindo novos líderes e novas referências. Não podemos nos apegar a essas leituras.

“O Haddad já se cacifa para 2022”, “O Ciro se cacifa”. O Ciro Gomes saiu muito bem no primeiro turno, com moral, e depois jogou essa moral na lata do lixo ao se abster da disputa política do segundo turno. A vida útil do Ciro durou três semanas. É assim a lógica da luta de classes.

Acho que a esquerda e os movimentos populares que tem causas bem específicas, de mulheres, moradia, terra e movimento sindical, temos que nos debruçar com serenidade, fazer as avaliações críticas e autocríticas e retomar a nossa agenda história da classe trabalhadora, para enfrentar os desafios da vida e da história.

Ficou claro durante essa campanha: nós temos que retomar o trabalho de base, que até o Mano Brown puxou a orelha e ele estava correto. Se nós tivéssemos tido a paciência de, ao longo desses seis meses, ter ido de casa em casa, nos bairros da periferia, onde vive o povo pobre, acredito que teríamos outro resultado eleitoral. O povo entende, mas ninguém vai lá falar com ele.

Temos que ter claro que o que altera a correlação de forças, não é discurso, não é mensagem no Whatsapp. O que altera a correlação de forças e resolve os problemas concretos da população é se nós organizarmos a classe trabalhadora e a população para fazer lutas de massa e resolver seus problemas.

Se falta trabalho, temos que fazer a luta contra o desemprego. Se o gás está muito alto, temos que fazer a luta para abaixar o preço do gás. Isso exige luta de massa. Da mesma forma, a esquerda abandonou a formação política. As pessoas foram iludidas pelas mentiras da campanha do Bolsonaro no Whatsapp, por que? Porque não tem discernimento político para saber o que é mentira e o que fazia parte do jogo. Isso só se resolve com formação política e ideológica, quando a pessoa tem discernimento, conhecimento, para ela julgar por si mesmo e não esperar orientação de ninguém.

Assim como temos que potencializar ainda mais esse belo trabalho que vocês fazem no Brasil de Fato, com rádio, jornal, tabloide, internet, que é potencializar nossos meios de comunicação populares. De fato a televisou parou de pesar na formação de opinião das pessoas. Então, temos que construir os nossos meios de comunicação. Agora é o tempo ideal.

Finalmente, temos que fazer um novo debate no país, sobre um novo projeto soberano para uma sociedade igualitária e justa. Como essa campanha foi baseada na mentira e na luta contra mentira, nós não discutimos programa, não discutimos um projeto estrutural pro país. Agora temos que recuperar esse debate e nos próximos meses e anos, reconstruir uma unidade popular entorno de um projeto. Um programa de soluções para o povo, porque do outro lado, do governo, não virá.



Até eleitor de Bolsonaro não quer privatizações de empresas estatais

22 de Outubro de 2018, 16:39, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso

Em pesquisa BTG divulgada hoje (22.10.2018), 61% dos brasileiros são contrários às privatizações das empresas estatais.

Entre os eleitores de Fernando Haddad (PT), 74% são contrários.

Entre os eleitores de Bolsonaro (PSL), 49% são contrários, e 43% a favor.

Como se vê, mesmo se Bolsonaro vencer terá dificuldades em privatizar e aplicar a cartilha ultraneoliberal de seu provável ministro da fazenda.



Justiça reitera abusividade de shows do Ronald McDonald em escolas

22 de Outubro de 2018, 16:39, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso

Caso a rede de fast food descumpra a decisão, estará sujeita a multa de R$ 100 mil por apresentação realizada

O juiz Fabio Calheiros do Nascimento, da Segunda Vara Criminal e da Infância de Barueri, reconheceu, ontem (18), o caráter publicitário da apresentação realizada nas escolas pelo McDonald’s – o “Show do Ronald”. A decisão foi dada em ação civil pública, iniciada em 2016 pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, contra a empresa. Na sentença, o juiz ressaltou que a apresentação “dirige a criança para o consumo sem permitir que ela o faça conscientemente – ou talvez, seja melhor dizer, ainda mais inconscientemente -, já que a percepção de que os dados recebidos têm conotação mercadológica fica velada, posta em segundo plano abaixo do pretexto educativo do ato”.

Levantamento feito pelo Criança e Consumo, em 2013, constatou que, em apenas dois meses, mais de 60 apresentações do palhaço acontecerem em escolas de educação infantil e creches em diversos estados do país. Esta é a segunda decisão em relação ao caso nos últimos dias. No dia 11, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), vinculado ao Ministério de Justiça, multou em seis milhões de reais o McDonald’s em razão da publicidade abusiva direcionada ao público infantil no ‘Show do Ronald’.

“A decisão do judiciário deixa ainda mais evidente que o ambiente escolar é um espaço de desenvolvimento, que deve ser preservado de qualquer tipo de ação publicitária, inclusive aquelas que tentam se passar por educativas. As empresas precisam entender isso e cumprir seu dever constitucional e legal de preservação e garantia dos direitos das crianças com prioridade absoluta. A responsabilidade é de todos nós, inclusive empresas”, diz Ekaterine Karageorgiadis, coordenadora do programa Criança e Consumo.

Relembre o caso

Em 2016, o Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, ajuizou Ação Civil Pública requerendo a proibição da realização da ação mercadológica “Show do Ronald McDonald” nas escolas. O Criança e Consumo foi aceito como amicus curiae na ação, em maio de 2018, e prestou informações a respeito da ilegalidade da prática e da denúncia que havia feito sobre o caso para o DPDC, em 2013.

Em 18 de outubro de 2018, o juiz Fabio Calheiros do Nascimento, da Segunda Vara Criminal e da Infância de Barueri, proferiu decisão determinando que os shows são publicidade abusiva e proibiu a execução do ‘Show do Ronald’ nas escolas do estado de São Paulo. A empresa pode recorrer da decisão.

Sobre o Criança e Consumo

Criado em 2006, o programa Criança e Consumo, do Alana, atua para divulgar e debater ideias sobre as questões relacionadas à publicidade dirigida às crianças, bem como apontar caminhos para minimizar e prevenir os malefícios decorrentes da comunicação mercadológica.

Sobre o Instituto Alana

O Instituto Alana é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que aposta em programas que buscam a garantia de condições para a vivência plena da infância. Criado em 1994, é mantido pelos rendimentos de um fundo patrimonial desde 2013. Tem como missão “honrar a criança”.



Liberalismo e fascismo: afinidades eletivas

10 de Outubro de 2018, 16:17, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso

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Por Augusto C. Buonicore, no site da Fundação Maurício Grabois e divulgado pelo Altamiro Borges:

Se fascismo e liberalismo não são iguais, tão pouco existe entre eles uma muralha intransponível. Diria mesmo que existem mais pontos de convergência do que sonha a nossa vã filosofia. Foi na América Latina que o conluio liberalismo e fascismo tornou-se mais evidente. Os liberais constituíram-se em vanguarda ideológica e política da maior parte dos golpes militares ocorridos ao longo do século 20. Por aqui, em 1964, os muito liberais Estadão, Folha e UDN conclamaram abertamente a intervenção militar e aplaudiram a repressão que se seguiu à autodenominada “redentora”. O mesmo fenômeno se repetiu no Chile, Argentina, Uruguai, Bolívia, Paraguai etc. O fenômeno voltou a se repetir no século 21.

Num artigo escrito há alguns anos atrás tratamos da relação conflituosa, às vezes explosiva, entre o liberalismo e a democracia política. Buscamos, seguindo as preciosas indicações de Domenico Losurdo e João Quartim de Moraes, demonstrar que os mecanismos da democracia moderna – especialmente o sufrágio universal e o direito de organização – são frutos das lutas populares e que, em certo sentido, foram vitórias dos trabalhadores contra o liberalismo.

Lembramos, por exemplo, que os principais ideólogos da burguesia, os liberais, foram porta-vozes do sufrágio censitário – baseado na renda – e do sufrágio qualificado – baseado na educação formal e/ou nas funções sociais de mando exercidas. As duas formas de sufrágio teriam por finalidade excluir as classes populares do jogo político. Democracia, entendida como soberania popular, seria quase um sinônimo de “despotismo das massas”.

John Stuart Mill (1806-1873), um liberal bastante avançado para a sua época, chegou a declarar: “Considero inadmissível que uma pessoa participe do sufrágio sem saber ler, escrever e, acrescentaria, sem possuir os primeiros rudimentos de aritmética”. Em outra passagem, sem meias palavras, afirmou: “Um empregador é mais inteligente do que um operário por ser necessário que ele trabalhe com o cérebro e não só com os músculos (…). Um banqueiro e um comerciante serão provavelmente mais inteligentes do que um lojista, porque têm interesses mais amplos e mais complexos a seguir (…). Nestas condições, poder-se-iam atribuir dois ou três votos a todas as pessoas que exercessem uma destas funções de maior relevo.”

Naquele artigo tratamos apenas da análise da gênese da democracia e não das características que ela assumiu ao longo dos últimos séculos. A democracia política, ao contrário do que pensavam os operários e burgueses no século 19, demonstrou que também poderia ser funcional ao capitalismo. Por isso mesmo, a resistência burguesa foi se reduzindo pouco a pouco. Reduzida, mas não completamente eliminada. A democracia política não é – e jamais será – um valor universal para ela e seus ideólogos.

Paradoxalmente, no início do século 20, os ideólogos do fascismo foram buscar no arcabouço liberal clássico muitas de suas teses sobre o direito à participação política das massas populares. Vejamos o que afirmou Mussolini, em 1925, logo após a sua triunfal “Marcha sobre Roma”: “é absurdo conceder os mesmos privilégios a um homem inculto e a um reitor de universidade. Não é abaixando as classes elevadas que se cria a igualdade (…). Atribuem-me a ideia de restringir o sufrágio universal. Não! Todo cidadão conservará seu direito de voto ao parlamento de Roma. Mas um professor universitário ou um grande técnico deve ter mais uma palavra a dizer do que um carregador analfabeto”. Mussolini também, como a maioria dos liberais dos séculos 18 e 19, era contrário ao sufrágio feminino. No mesmo discurso, citado acima, declarou: “Sou partidário do sufrágio universal, mas não do sufrágio feminino”.

Poucos se espantaram com tal declaração, pois ela estava dentro do senso comum liberal-conservador predominante na época. Mesmo o sufrágio universal masculino era uma novidade na grande maioria dos países capitalistas e as mulheres ainda não tinham direito ao voto nem na Inglaterra, mãe do liberalismo, e nem na França, terra da revolução liberal-democrática.

Este descompasso entre democracia política e liberalismo ainda podia ser sentido na segunda metade do século 20. Um dos fundadores do neoliberalismo, Von Hayek, chegou a defender que não haveria nenhuma incompatibilidade entre sufrágio censitário, exclusão política das mulheres e a democracia. Escreveu ele: “É útil recordar que, no país em que a democracia é mais antiga, e mais bem-sucedida, a Suíça, as mulheres ainda são excluídas do voto e, pelo que parece, com a aprovação da maior parte delas. Também parece possível que, numa situação primitiva, um sufrágio limitado, por exemplo, reduzido somente aos proprietários de terra, consiga formar um Parlamento tão independente do governo que possa controlá-lo de modo eficaz.”

Continuou o decano do neoliberalismo: “nem o mais dogmático dos democratas pode afirmar que toda e qualquer ampliação da democracia é um bem. Independentemente do peso dos argumentos a favor da democracia, ela não é um valor último, ou absoluto, e deve ser julgada pelo que realizar. (…) A decisão relativa à conveniência ou não de se ampliar o controle coletivo deve ser tomada com base em outros princípios que não são os da democracia em si”. Os princípios aos quais ele se refere seriam: a defesa da propriedade privada e da “livre iniciativa” (para o capital). Dentro deste esquema limitado, as ditaduras de direita, sob determinadas condições, também poderiam se tornar “os melhores métodos” para os fins últimos propostos. Não deixa de ser irônico que os liberais ainda sustentem que é a esquerda que tem uma visão limitada e instrumental da democracia política.

Liberalismo e colonialismo

Mas é em relação ao problema do colonialismo que o velho e o novo liberalismo mais se aproximam das teorias reacionárias e proto-fascistas. Ao contrário do que geralmente se pensa, o liberalismo na sua forma clássica não se constituiu num entrave ao colonialismo e ao imperialismo nascente. Ele forneceu as justificativas ideológicas para a expansão europeia – e, mais tarde, estadunidense – sobre a África, a Ásia e a América Latina.

Como bem lembrou Losurdo, um liberal do porte de um Tocqueville comemorou assim a vitória inglesa sobre a China na infame Guerra do Ópio: “Eis afinal a mobilidade em combate contra o imobilismo chinês! Trata-se de um acontecimento grandioso, sobretudo quando se considera que é mera continuação, última etapa numa série de acontecimentos da mesma natureza, que gradativamente vão empurrando a raça europeia para além de suas fronteiras, submetendo sucessivamente todas as outras raças ao seu império ou sua influência (…); é a sujeição das quatro partes do mundo, por ora da quinta parte. Por isso, é bom não se maldizer demais o nosso século e a nós mesmos; os homens são pequenos, mas os acontecimentos são grandiosos”.

John Stuart Mill, por sua vez, na sua obra clássica Da Liberdade, escreveu: “O despotismo é uma forma legítima de governo quando se está a lidar com bárbaros, desde que o fim seja o progresso e os meios sejam justificados pela sua real consecução. A liberdade, como princípio, não é aplicável em nenhuma situação que anteceda o momento em que os homens se tenham tornado capazes de melhorar através da livre discussão entre iguais. Até então não haverá nada para eles, salvo a obediência absoluta a um Akbar ou a um Carlos Magno se tiveram sorte de encontrá-los.” Para Mill, parece que liberdade e a democracia só teriam plena validade no mundo ocidental e cristão. Também não podia ter pesos iguais para a elite e as massas trabalhadoras, mesmo nos países capitalistas centrais. Por isso, o voto censitário e qualificado. Assim, essas noções não poderiam ter nenhum valor universal.

Certas ideias dos séculos 18 e 19 continuaram fazendo estragos nos séculos seguintes. Karl Popper – liberal e defensor das chamadas “sociedades abertas” –, num artigo recente, escreveu: “Libertamos esses Estados (as colônias) de modo muito apressado e simplista” e comparou este fato ao de “se abandonar uma creche a si mesma”. O que ele se esqueceu de dizer é que a libertação das colônias não foi dádiva das metrópoles europeias, mas uma conquista arrancada com muita luta Em muitos casos precisou-se de anos de guerras de libertação nacional sangrentas. As potências ocidentais França, utilizaram os meios mais bárbaros para manter seus impérios além-mar. O filme Batalha de Argel retrata bem esses métodos ditos civilizados usados pelo colonialismo francês no norte da África.

O fim da União Soviética e das experiências socialistas no Leste Europeu ocasionou uma profunda alteração na correlação de forças mundial a favor do imperialismo. Isso teve impacto no campo da luta de ideias. O liberalismo – na sua versão neoliberal – tornou-se amplamente hegemônico, e velhos valores reacionários (como o racismo), anteriores às revoluções socialistas e anticoloniais, adquiriram novo vigor. Justificam-se a guerra e a ocupação de territórios do terceiro-mundo em nome da liberdade, da democracia e dos direitos humanos. Como no passado, novamente, a barbárie se impõe em nome da civilização e do progresso.

Fascistas e liberais

Não pretendemos aqui colocar um sinal de igualdade entre liberalismo e fascismo. Após a trágica experiência de ascensão de Hitler ao poder na Alemanha, a esquerda aprendeu a importância de distinguir os dois termos. A confusão neste terreno conduziu os trabalhadores a uma das maiores derrotas de sua história, que ocorreu num fatídico janeiro de 1933.

Se fascismo e liberalismo não são iguais, tão pouco existe entre eles uma muralha intransponível. Diria mesmo que existem mais pontos de convergência do que sonha nossa vã filosofia. Isso se explica, fundamentalmente, porque os dois são expressões ideológicas de uma mesma e única classe: a burguesia. Esta constatação não é secundária.

Durante as últimas décadas, os ideólogos burgueses procuraram reverter o jogo e colocaram um sinal de igualdade entre o comunismo e o nazismo, tachando-os indistintamente de totalitários. Neste esquema a contraposição ao totalitarismo (comunista e nazista) seria feita pelo liberalismo político e econômico. Dentro desta mesma operação ideológica, o termo liberalismo novamente foi amalgamado com o de democracia. Os pais do liberalismo foram promovidos a pais da democracia moderna. Constituiu-se, assim, o mito ou a fórmula mais eficiente da política moderna: liberalismo = democracia.

Ironicamente, Quartim de Moraes afirmou: “Os politicólogos liberais costumam enfatizar as semelhanças entre fascismo e comunismo, apresentando-os como duas variantes do que chamam de totalitarismo (…) (mas) qualquer estudo histórico-estatístico minimamente objetivo mostraria que a quantidade de liberais que aderiram ao fascismo foi incomparavelmente maior do que a de comunistas”. Por fim, não “foi nos países do extinto bloco soviético que os exterminadores de judeus e de comunistas, membros da SS ou esquadrões da morte (…) encontraram refúgio, mas principalmente no muito liberal Canadá”. Acrescentaria aqui a operação secreta realizada pelo governo estadunidense – em comum acordo com o Vaticano – para dar cobertura à fuga de criminosos de guerra alemães, especialmente oficiais e cientistas.

No entanto, foi no nosso continente que o conluio entre liberais e fascistas tornou-se mais evidente – uma aliança que produziu uma das páginas mais sombrias da nossa história. Os liberais latino-americanos tornaram-se a vanguarda ideológica e política da maior parte dos golpes militares ocorridos na segunda metade do século 20, inclusive no Brasil. Por aqui, em 1964, os muito liberais Estadão, Folha e UDN conclamaram abertamente a intervenção militar e aplaudiram a repressão que se seguiu à autodenominada “redentora”. O mesmo fenômeno se repetiu no Chile, Argentina, Uruguai, Bolívia, Paraguai etc.

Não foi sem razão o esforço feito por alguns neoliberais para retirar as ditaduras militares latino-americanas da lista de regimes ditos totalitários. Elas passaram a ser definidas apenas como autoritárias. Males menores diante da ameaça do totalitarismo comunista.

Escreveu Hayek, “o oposto de democracia é governo autoritário: do liberalismo é totalitarismo. Nenhum dos dois sistemas exclui necessariamente o oposto do outro: a democracia pode exercer poderes totalitários, e um governo autoritário pode agir com base em princípios liberais”. E continuou: “Devo confessar que prefiro governo não-democrático sob a lei a governo democrático ilimitado (e, portanto, essencialmente sem lei)”. Por isso, ele e Milton Friedman deram apoio aberto e assessoraram o governo neoliberal “não-democrático” de Pinochet.

Maior exemplo da possibilidade de articulação entre neoliberalismo e fascismo pode ser extraído da vergonhosa entrevista dada pelo mesmo Hayek ao jornal chileno El Mercúrio em abril de 1981. Depois de dar apoio à ditadura, justificou: “Uma sociedade livre requer certas morais que em última instância se reduzem à manutenção das vidas; não à manutenção de todas as vidas, porque poderia ser necessário sacrificar vidas individuais para preservar um número maior de vidas. Portanto, as únicas normas morais são as que levam ao ‘cálculo de vidas’: a propriedade e o contrato”. Naquele exato momento em que o papa do neoliberalismo dava sua entrevista, muitas vidas estavam sendo sacrificadas nos porões da ditadura fascista do general Pinochet.

* O título original desse artigo era Fascismo, liberalismo e colonialismo e foi publicado no livro Marxismo, história e a revolução brasileira (Editora Anita Garibaldi, 2009).

** Augusto Buonicore é historiador, mestre em Ciência Política pela Unicamp e diretor de publicações da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e a revolução brasileira; Meu Verbo é Lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas; e Linhas Vermelhas: marxismo e os dilemas da revolução, publicados pela Fundação Maurício Grabois e Editora Anita Garibaldi.

Bibliografia

LOSURDO, Domenico. Fuga da história? Rio de Janeiro: Revan, 2005.

________________. Democracia e bonapartismo. São Paulo: Ed. Unesp; Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2005.

________________. Liberalismo. Entre civilização e barbárie. São Paulo: Anita Garibaldi, 2006.

________________. A linguagem do império: léxico da ideologia estadunidense. São Paulo: Boitempo, 2010.

MORAES, João Quartim de. “Contra a canonização da democracia”, in Crítica Marxista, n. 12, São Paulo: Boitempo, 2001.

________________. “Liberalismo e fascismo”, in Crítica Marxista, n. 8, São Paulo: Xamã, 1999.

MORAES, Reginaldo. Neoliberalismo: De onde vem, para onde vai? São Paulo? Senac, 2001.