Ir para o conteúdo
ou

Thin logo

Posts do blog

Tela cheia
 Feed RSS

Blog

3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.

Como são lindos os neoliberais, mas tudo é muito mais

26 de Março de 2024, 12:16, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso


Por Ricardo Viveiros


Livros são um prazer. Além do conteúdo, as conexões que provocam com outras obras me gratificam. A nova razão do mundoEnsaio sobre a sociedade neoliberal, de Pierre Dardot e Christian Laval, surpreendeu pela quantidade de referências que me vieram à mente. Como em um caleidoscópio, convidei para “conversar” Friedrich August von Hayek, John Maynard Keynes, Fernando Henrique Cardoso, Michel Foucault, Karl Marx e representantes da Escola de Chicago.

Crítico que sou, a ideia de que há algo sensato em uma sociedade liberal não me convence. O colonialismo foi uma dominação capitalista. Parafraseando Caetano Veloso, “cantarolei como são lindos os neoliberais, mas tudo é muito mais” (Podres poderes, 1984). Fique claro que a “nova razão” dos autores está associada ao novo sentido e à pretensão holística do neoliberalismo. A dominação sobre a economia é só o ponto de partida. Dardot e Laval utilizam complexas análises históricas e sociais, além de outras psicanalíticas, para fundamentar a obra. Talvez, o pensamento que melhor sintetize o neoliberalismo esteja na frase da ex-primeira-ministra inglesa, Margaret Thatcher, “A economia é o método. O objetivo é mudar a alma.”. A ideia assombra, mas faz sentido.

Para os detratores de ideologias, sejam elas quais forem, os intelectuais recorrem à interpretação vanguardista com a precisa fundamentação filosófica de Michel Foucault e Karl Marx, entre outros, com o propósito de revelar o mito neoliberal da objetividade econômica. Neoliberalismo é ideologia, sim, e das mais complexas! A psicanálise é outra ferramenta indispensável para elucidar o problema. Muitos fantasmas e cobranças que ocupam nossa mente vêm dessa “nova razão”. Corpo perfeito, família perfeita e profissional perfeito são idealizações imaginárias que alimentamos sem cuidado. A alienação e a distância que se toma da emancipação humana, proposta por Marx, preocupa.

Na política, a deterioração da democracia parece algo natural nessa nova diretriz. Ao neoliberalismo não importam liberdade e justiça, exceto se estiverem em favor do sistema de dominação e lucro. Políticos, como o estadunidense Donald Trump, conseguem manter a popularidade e podem voltar à Presidência, mesmo após a prática de criminosos atos antidemocráticos. Ainda que a economia seja um pilar importante da avaliação dos cidadãos, questões como xenofobia, discriminação, violência e outras são ignoradas dentro da cultura neoliberal. Está aberto o caminho para discursos totalitários.

Ao contrário do interesse da sociedade, está no consenso que o controle da coisa pública pelo setor privado é a melhor opção. Ou seja, o cidadão prefere não fazer parte da administração dos seus impostos. Assim, além de atestar a própria incapacidade de participação na vida do país, o eleitor afirma que o setor privado — que objetiva o lucro — está mais imbuído de melhores intenções do que o gestor público. A dominação não é só econômica, a “alma” já está comprometida.

Talvez, desenvolvimentistas, como Hayek e Keynes, não tivessem a dimensão do que se tornaria o neoliberalismo. O combate às teorias que privilegiavam iniciativas coletivas e a valorização de ações individuais não acabaria em uma cultura de dominação tão ampla, até psiquiátrica. Isso não estava no horizonte dos representantes da Escola de Chicago, eles pensavam em melhorar a economia. Menos ainda, em Fernando Henrique Cardoso e sua “Teoria da Dependência”, que confrontada com o seu exercício do poder revela a luta entre o pensador e o político. Mas de alguma forma, todas essas teses compõem a base do neoliberalismo real.

A dinâmica da economia funciona com uma complexidade que não é vista pela maioria das pessoas. Ações nas bolsas de valores são movidas ao sabor das especulações. Apenas a minoria consegue avaliar quanto o sistema é invasivo no seu cotidiano. Os que têm boas interpretações da realidade devem contribuir para a construção da liberdade mais plena de todos nós. Nesse sentido, o livro de Dardot e Laval traz a lição: a consciência de que vida humana e suas relações devem estar acima de qualquer interesse econômico.

Ricardo Viveiros, jornalista, professor e escritor, é doutor em Educação, Arte e História da Cultura; autor, entre outros, de A vila que Descobriu o Brasil (Geração, 2014), Justiça seja feita (Sesi-SP, 2017) e Memórias de um tempo obscuro (Contexto, 2023).



Cinema Brasileiro: Raça e Gênero nos filmes de grande público

14 de Março de 2024, 19:07, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso

Principais highlights da pesquisa:

Falta de mulheres na direção em 2022: Dos 10 filmes de grande público lançados em 2022, nenhum foi dirigido por mulheres, algo que não ocorria há uma década.

Exclusão de mulheres pretas ou pardas na direção: Em quase 30 anos analisados na pesquisa, nenhuma mulher negra dirigiu um filme de grande público.

Desigualdades de gênero e raça: A pesquisa mostra severas desigualdades de gênero e raça nas produções de grande público do cinema brasileiro, com os homens brancos dominando as principais funções narrativas, o que está relacionado também a seu privilégio na aquisição de recursos públicos. 

Notoriedade para homens pretos ou pardos na direção em 2022: Dois filmes dirigidos por homens negros foram lançados, incluindo um através de uma política de fomento direcionada a realizadores negros. 

Avanços tímidos na função de roteiro: 2022 registrou o menor domínio de homens brancos entre roteiristas de filmes de grande público, mas persistiu a total exclusão de mulheres pretas ou pardas.

Equilíbrio de gênero e raça nos elencos em 2022: Em relação ao ano anterior, 2022 marcou um equilíbrio maior de diversidade entre os personagens. A maior participação de diretores negros teve impacto na maior inserção de negros no elenco principal das produções.

Fomento de políticas públicas: É imprescindível que haja mais investimento em políticas públicas de diversidade para reverter as desigualdades.

Sobre o Gemaa: O Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa (GEMAA) é um núcleo de pesquisa com inscrição no CNPq e sede no IESP-UERJ. Criado em 2008 com o intuito de produzir estudos sobre ação afirmativa a partir de uma variedade de abordagens metodológicas, o GEMAA hoje desenvolve diversas investigações sobre as desigualdades de raça e gênero na educação, na mídia, na política e em outras esferas da vida social.



De que Estado estamos falando?

5 de Março de 2024, 14:08, por Feed RSS do(a) Blog do Tarso


Por Jonathan Hernandes Marcantonio

Quando leio os comentários e opiniões acerca da divulgação do déficit público pelo governo federal, tenho aquela sensação de que falta algo e não é pela qualidade das opiniões (de parte delas, pelo menos), mas sim pelo enfoque que essas análises dão a esse fato: Todas as opiniões, balizadas em números e projeções de crescimento econômico, tentam extrair desses mesmos números sínteses avaliativas sobre o sucesso ou fracasso do governo federal (tanto o atual, como o anterior). Porém o que me faz sentir a lacuna mencionada tem a ver, acredito, com a mudança paulatina de perspectiva que a esfera pública tem sobre o papel que o Estado Brasileiro deve ter na economia. Disso, é possível se extrair dois questionamentos: (1) Com relação à economia, o Estado serve para quê? E, atualmente, mais importante: (2) Nós queremos que o Estado continue servindo para isso?

Vamos tentar entender a primeira: Não sei se por vício profissional, toda vez que surgem questões dessa natureza, tento consultar a Constituição Federal para saber se, lá, há algo escrito a respeito e, nesse caso, há. Em relação à economia, a Constituição apresenta o Estado Brasileiro dentro de um modelo keynesiano, o que quer dizer que o Estado possui uma função distinta dos demais agentes econômicos. Trocando em miúdos, enquanto todos nós, pessoas e empresas, buscamos obter, através das relações econômicas, ganhos monetários por intermédio dos fatores de produção; o que detemos (capital, terra e trabalho, basicamente), o Estado se preocupa em manter o mercado saudável e funcional, com políticas de ajustes em pontos que o livre mercado efetivamente não consegue agir. Esses temas são variados e podem ser desde questões de redução de desigualdade social, até questões de combate a monopólios, cartéis econômicos, manutenção de livre iniciativa, etc.

As opiniões de especialistas também variam sobre o sucesso e os benefícios desse modelo e por volta do fim do século XX, esse debate, que ainda existe no âmbito científico, se politiza, resultando em uma apropriação ideológica, com todas as consequências de rotulação, intolerância e conclusões precipitadas que esse tipo de apropriação gera. Os mais liberais, ditos de direita, criticam essa abordagem econômica do Estado, dizendo que isso atrapalha a economia (mesmo que historicamente tenha salvado o capitalismo algumas vezes). Além disso, atribuem, muito equivocadamente, à preocupação com a redução das desigualdades sociais um traço “socialista” ou “comunista” a depender do fervor e do nível de ignorância de quem fala. Já aqueles mais progressistas (mas ainda capitalistas, frise-se) acreditam que o progresso e crescimento econômico só é possível se alguns alicerces sociais estiverem satisfeitos. Esses, considerados de “esquerda”, estão, quer se aceite ou não, mais alinhados com a perspectiva capitalista prevista na Constituição. Dessa forma, quando se enxerga o papel do Estado nessas lentes, não há nada de estranho em se gastar, pois o gasto se refere a um projeto de Nação (previsto no artigo 3º da Constituição Federal), em que o Estado arrecada e redistribui a partir das demandas próprias para a construção de um Brasil mais próspero e menos desigu al. Se todos estivessem de acordo com essa perspectiva, os textos sobre o déficit público deveriam estar muito mais preocupados com o que, e com qual qualidade esses gastos foram realizados e, daí sim, teríamos opiniões relevantes e construtivas acerca desse tópico.

Contudo, o que se vê, em alguns casos, é uma crítica, ainda incipiente e rasa, sobre essa atuação estatal. Críticas que relacionam quase que como sinônimos “gastos” e “privilégios” e, embora sem argumentações robustas, são relevantes por nos levar à segunda pergunta, pois mostram um certo descontentamento com o modelo vigente: Ainda queremos ser um Estado keynesiano? Essas reclamações são oriundas do povo brasileiro ou atribuídas ao povo de maneira retórica, masc arando interesses particulares?

Dentro desse contexto, então, temos duas formas de enxergar o déficit público de mais de 230 bilhões de reais: Ou como uma questão transitória que será minimizada a partir de maior e mais efetiva fiscalização com os gastos públicos, bem como pela redução de demandas específicas causadas por políticas públicas duvidosas, como bloqueio de precatório por lei, ou ainda, por antecipação de pagamentos desses mesmo precatórios, e, nesse caso, a vida segue; ou partimos do pressuposto de que o Estado é um estorvo à Economia e que o dinheiro destinado ao seu “sustento” deve se restringir a uma qu antia específica e o resto deve ser drasticamente cortado. Nesse caso, precisamos parar e rediscutir, desde o tamanho do Estado, aos benefícios pagos a servidores e políticos, incluindo o salário e a quantidade de verbas e emendas parlamentares pagas, o que abrange necessariamente aqueles dos que defendem o Estado Mínimo. Os dois, ao mesmo tempo, não dá.

 [1] Vale lembrar que esse modelo econômico ganha força em razão da Crise de 1929 e ganhou modelos variados em diversos Estados contemporâneos, incluindo os EUA.

Jonathan Hernandes Marcantonio
Doutor em Direito pela PUCSP
Advogado empresarial em São Paulo