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“A privatização de cadeias trata o preso como mercadoria e o sistema carcerário como um mercado lucrativo”

4 de Setembro de 2015, 12:44 , por Feed RSS do(a) Blog do Tarso - | No one following this article yet.
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Da Abong

Para a assessora do programa de Justiça da Conectas Vivian Calderoni, a terceirização dos presídios segue a lógica de encarceramento em massa e da violação dos direitos humanos

O Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo – 607.700 presos/as -, atrás apenas da Rússia, China e Estados Unidos. Em 20 anos (1992-2012), essa população aumentou em 380% e o País só tende a encarcerar mais. Se a taxa de prisões continuar no mesmo ritmo, um em cada 10 brasileiros/as estará atrás das grades em 2075. Os dados foram divulgados pelo Ministério da Justiça em junho deste ano.

Atualmente existem no Brasil 22 penitenciárias privadas que têm seus serviços terceirizados para grandes empresas e uma penitenciária masculina, fruto de parceria público-privada (PPP), localizada em Ribeirão das Neves, no Estado de Minas Gerais.

Silvia Patrícia Costa, conselheira penitenciária do Estado do Tocantins e membro do Centro de Direitos Humanos de Palmas (CDHP), afirma que, por trás da privatização, existem interesses políticos e econômicos que “comprometem a população alvo de criminalização que são os jovens, negros e periféricos.”

O presídio privado é construído pelo Estado e sua administração é feita por empresas terceirizadas. Já na parceria público-privada é de responsabilidade da empresa desde sua licitação e projeto.

Vivian Calderoni, assessora do programa de Justiça da Conectas, conta que a aposta nas prisões como principal ferramenta para inibir a violência só faz com que ela aumente porque a ressocialização dos/as internos/as não acontece. “O sistema ignora qualquer padrão ético e de dignidade humana e rompe com todos os valores de uma sociedade que se pretende democrática. Essa lógica é altamente discriminatória e seletiva, pois escolhe a dedo e em massa qual classe social deve ser encarcerada”, afirma.

Terceirização das cadeias

De acordo com o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Carcerário Brasileiro recentemente publicado, a privatização total ou parcial do sistema é a melhor aposta para o fim da crise em que os presídios se encontram.

Maus-tratos e violência; falta de condições materiais, de acesso a saúde, educação, defesa e trabalho; e superlotação das prisões brasileiras são problemas que os/as deputados/as creem que serão resolvidos com a terceirização das cadeias.

Viviane afirma que “o encarceramento em massa é agravado com o modelo de privatização de presídios, que trata o preso como mercadoria e o sistema prisional como um mercado lucrativo em expansão a ser explorado.” Ela conta que a construção de um presídio privado para homens e mulheres está sendo negociada em Resende, no Rio de Janeiro, além da criação de uma cadeia feminina na Paraíba, que seguirá os mesmos moldes.

Para Silvia Patrícia, “o sistema prisional brasileiro está sucateado e falido, então é passada a falsa imagem de que a grande solução é a privatização dos serviços e das unidades prisionais.”

Presídio de Ribeirão das Neves

Existem aproximadamente 200 presídios privados no mundo todo, sendo que metade está localizada nos Estados Unidos. Foram essas penitenciárias que moldaram a PPP de Ribeirão das Neves, que teve seu contrato assinado em 2009, na gestão do então governador Aécio Neves (PSDB).

O complexo de cinco unidades, resultado da parceria entre os Gestores Prisionais Associados (GPA) e o Estado mineiro começou a ser construído em 2013 com um orçamento de R$ 280 milhões. O presídio se assemelha às cadeias dos Estados Unidos, que têm sistema de vigilância eletrônica e celas com aberturas automáticas.

A PPP prevê assistência jurídica, odontológica e médica, além de funcionários/as contratados/as pela própria empresa. Cada preso custa R$ 2,7 mil mensais do Estado, 66% a mais do valor gasto com os presídios públicos. Então, na prática, é muito mais caro terceirizar.

Das 3.336 vagas da PPP de Ribeirão das Neves, pelo menos 90% devem estar sempre ocupadas, de acordo com uma das cláusulas do contrato firmado pelo prazo de 27 anos. “Quanto mais se encarcera, mais rentabilidade tem o negócio. O Estado mantém as unidades abarrotadas, sempre dentro da cota, para cumprir seu contrato”, explica Silvia Patrícia.

O presídio seleciona os/as presos/as: não podem fazer parte de facções criminosas, nem ter cometido crimes hediondos, para que o andamento do projeto seja efetivo. “É uma forma de camuflar os resultados negativos da privatização dos presídios e vender ao público uma imagem de que a terceirização é a solução para a ressocialização do preso”, acredita a conselheira penitenciária.

Redução da Maioridade Penal

A Proposta de Emenda à Constituição 171/93 (PEC da maioridade penal) foi aprovada pela Câmara dos Deputados mês passado e agora segue para dois turnos de votação no Senado. O texto prevê a redução da maioridade nos casos de crimes hediondos – como estupro e latrocínio – e para homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte.

O deputado Rogério Rosso (PSD) apresentou o Projeto de Lei 1958/15 (PL), que sugere a criação de “Centros de Ressocialização Juvenil” por meio da PPP, que tem forte aprovação dos/as deputados/as a favor da redução.

“Pode-se dizer que a redução da maioridade penal, o aumento do tempo de internação de adolescentes e a privatização dos presídios servem ao mesmo propósito de encarceramento em massa”, explica Viviane.

Ela acrescenta que não faz sentido apostar em um mercado sem trabalhar por sua ampliação, o que, neste caso, significa privar cada vez mais pessoas da liberdade: “a redução pode ser vista como um meio para um objetivo maior que obedece a interesses econômicos, especialmente com a privatização, que aumenta a população carcerária e o lucro das empresas.”


Arquivado em:Direito, Política Tagged: prisões, privatizações, terceirizações
Fonte: http://blogoosfero.cc/blog-do-tarso/blog-do-tarso/a-privatizacao-de-cadeias-trata-o-preso-como-mercadoria-e-o-sistema-carcerario-como-um-mercado-lucrativo