Por PATRÍCIA CAMPOS MELLO, na Folha de S. Paulo de hoje
Enquanto os manifestantes gritavam contra a corrupção e o Estado inchado na avenida Paulista, um punhado de jovens do Itaim Paulista e Cidade Tiradentes, da zona leste, foi aos Jardins pedir mais emprego, ônibus barato e faculdade de graça.
Eram 13h quando o grupo da Zona Leste se reuniu no metrô Itaquera, seguindo convocações que circularam por WhatsApp e Facebook. Eram 30 pessoas. Metade era ligada ao PSDB ou ao Vem Pra Rua. O resto era estreante em passeata.
Os amigos Tony Silva Montenegro, 23, Rodrigo Paulino Rocha, 17, e seu irmão Leandro, 24, vieram direto do baile funk, sem dormir.
Levaram uma hora em dois ônibus do Itaim Paulista até a estação Itaquera do Metrô, e, de lá, mais uma hora até a avenida Paulista.
Leandro era confeiteiro em um supermercado e perdeu o emprego dois meses atrás. Vestia uma camiseta com a bandeira dos EUA, porque “a do Brasil sujou no baile”.
“A conta de luz está um absurdo, subiu muito”, disse Rodrigo. “Fora o crime: tiraram a guarita de lá do bairro e a viatura nunca passa.”
Assim que chegaram à Paulista, os três amigos levaram um susto ao ver duas senhoras tirando uma foto com os policiais da tropa de choque. “Selfie com o Choque já é demais”, disse Rodrigo, que teve um irmão de 25 anos assassinado há três anos, “confundido com um policial”.
Na avenida, os amigos cruzaram com um grupo fantasiado, tocando gaitas de foles: eram do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, ligado à Sociedade Brasileira de Defesa de Tradição, Família e Propriedade (TFP).
“Que porcaria é essa?”, perguntaram, e foram tirar selfies.
Enquanto a maior parte dos manifestantes usava camisa verde-amarela e carregava faixas, os jovens da periferia foram à paisana, de boné virado para trás, tênis Mizuno e Asics e cabelos com mechas coloridas.
Segundo o Datafolha, apenas 6,2% dos participantes do protesto tinham renda de até 2 salários mínimos (R$ 1.576), 3% se declararam negros e 17%, pardos.
“Acho que eles têm preconceito contra a gente, mas vim mesmo assim, porque a Dilma tem que sair” disse Tony, que é pedreiro.
Em seu manifesto, o Vem Pra Rua defende um país onde “a liberdade econômica é estimulada e o Estado não é maior que o necessário.” Kim Kataguiri, do Movimento Brasil Livre, prega “um Estado mínimo, que não se intrometa na vida do cidadão”. O grupo da periferia também está descontente com Dilma. Mas sua pauta passa longe do encolhimento do Estado.
Jennifer Soares, 20, promotora de vendas que ganha R$ 1.013 por mês, pega cinco conduções por dia e quer baixar a tarifa de ônibus. Outra reivindicação é faculdade de graça. “É preciso ter programas do governo para isso.”
Geraldo Lucas, 21, deve quase R$ 3.000 em mensalidades na faculdade e quer ampliação do Fies.
Para Oziel de Souza, do diretório do PSDB de Cidade Tiradentes, as manifestações não estão sintonizadas com a periferia. “A periferia quer bilhete único, mais estações de metrô, faculdade de graça e shoppings”, diz. “Mas participamos mesmo assim, porque queremos tirar a Dilma.”
Já para os três amigos do Itaim Paulista, o sono bateu, a água estava R$ 4 e a música não era lá essas coisas. Depois de apenas uma hora e meia na Paulista, foram para casa, porque na segunda precisam acordar cedo. E o ônibus continua cheio.
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