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Conto de Natal – Maria Frô

23 de Dezembro de 2012, 22:00 , por Desconhecido - 0sem comentários ainda | No one following this article yet.
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Da Maria Frô

Tinha 4 anos em 1968 e as coisas não andavam bem: milicos, estudantes nas ruas, repressão braba, Costa e Silva e coisa e tal…

Ela acreditava em papai Noel. Falou com o avô, pessoa ilustre em uma época em que os senhores de respeito, gravata e casa própria eram chefes de torcidas e levavam os netos para estádio.

A netinha tinha um orgulho tamanho do seu avô, adotou o Corinthians por causa do amor pelo avô. Ela lhe fazia confidências. Contou-lhe que queria ganhar uma boneca que andava.

A netinha acreditava em ovos fritos que já vinham temperados com cebola, em papel higiênico que vinha com um gatinho de brinde, porque via os gatinhos rolarem nos outdoors sobre macios papéis da cidade grande e jamais descobrira como a mãe escondia as cebolas dentro dos ovos fritos…

Ela acreditava em tudo que via e ouvia. O avô lhe disse que ia avisar papai Noel sobre a sua boneca, disse que era amigo dele e coisa e tal… Ela ficou feliz…

No dia 20 de dezembro o avô partiu para uma viagem. Não se sabe como, mas a família inteira, de todos os cantos do Estado tivera que sair às pressas, pegar trem para chegar a tempo.

Ela dormia no trem, bateu a cabeça e acordou pensando que estava bem perto do natal e logo, logo papai Noel iria trazer sua Andinha….

Quando, ainda sonolenta, viu o avô cheio de algodão no nariz, quis tirar. A tia velha e rabugenta não deixou, ralhou com a menina. Ela não entendia, mas sabia que aquelas flores, o algodão estavam sufocando seu avô.

As crianças foram obrigadas a sair da sala e ela nem havia conversado com o avô Teodoro, Teo como ela sempre pensava.

Sem remédio, sem escolha foi para o grande quintal que hoje abriga as catracas da estação do metrô Conceição.

Entre as ameixas e jabuticabas que apreciava, viu todos saírem carregando aquela cama esquisita. A menina até hoje detesta a cor roxa.

“Onde foram todos?” Ela perguntava aos primos já maiores e enfadados. Foi então que a tia mais nova, a tia Lu, falou que o avô Teo havia partido ao encontro do papai do céu.

A menina entristecida perguntou se demoraria, se viria antes do natal…

Quando soube que quando se visita Deus não se volta mais, ela achou ruim e disse que não queria ir, jamais, visitar esse tal de Deus e o achou prepotente, embora não conhecesse a palavra….. E refletia, embora digam que isso não é coisa de criança:

“Quem Deus pensava que era? Segurar uma visita assim? O avô era especial! Tinha de voltar, ela iria sentir saudades… Quem, afinal, ouviria suas histórias? Quem contaria histórias para ela? Quem gritaria gol com tamanha propriedade?”

A menina estava confusa. Tinha dúvidas e como já sentia saudades!

Papai Noel lembrar-se-ia do que o avô dissera? Afinal, o amigo do avô havia recebido o recado? Vai trazer ou não a sua Andinha?

Voltam todos pra casa… manhã do dia 25, a mãe pede para buscar os chinelos, dizia que estavam na sala. A menina não queria ir, tinha ciúmes do pai que agora estava em dengos com a mãe. Não queria, foi obrigada, mas foi… Topou com uma caixa embrulhada num cintilante papel de presente. O pacote era enorme, gigante mesmo… maior que ela, mal conseguia carregar…

Saiu correndo gritando, caindo, tropeçando, mãeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!!!!!!! O vô não esqueceu! Mãeeeeeeeeeeeeeeeeee papai Noel lembrou!!!!!!!!!!!!!!! Mãeeeeeeeeeeeeeeeeeee vô Teo falou com ele!!!!!!!!!!!!

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Vinte anos depois, envolta em surpreendentes descobertas, fuçando documentos, fuçando memórias, descobrindo dores… encontrou um carnê de um crediário assumido em uma loja na Lapa: uma compra no dia 22 de dezembro de 1968, 12 prestações, todas pagas em dia, uma mercadoria: Andinha.

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1998, os tempos também não estavam nada fáceis. Entretanto, a menina estava feliz. Seu pai era um passageiro, velho e cansado, não dispunha mais do trem que carregava passageiros do litoral para a capital. A irmã mais nova e mais irritadiça fez uma concessão nesse dia, afinal é tempo de esquecer as mágoas. A irmã mais nova e impaciente dirige, carregando uma família em pedaços.

A menina de 1968 estava feliz. Seu pai vinha ao seu encontro, vinha cear com a menina, relembrar tempos de Andinha.

Beijos pai querido, beijos vovô querido.

A menina acaba de descobrir que Papai Noel existe.

25/12/1998 Frô

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2008, fazendo a viagem de volta a menina, ainda viva, continua acreditando na existência do bom velhinho.


Filed under: Política
Fonte: http://blogdotarso.com/2012/12/24/conto-de-natal-maria-fro/

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