Na Folha de S. Paulo de sábado
CHICO ALENCAR
NÃO
Jabuti na árvore
Mérito duvidoso, método errado.
A contratação de obras públicas, delta histórico do rio da corrupção sistêmica, está em questão: o governo Dilma, por meio da lei 12.462/2011, instituiu o chamado Regime Diferenciado de Contratações (RDC) para as obras da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016.
Agora, a Câmara dos Deputados aprovou a extensão desse modelo para todas as obras do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC. Assim, cria uma alternativa supostamente simplificada à Lei das Licitações (8.666/1993).
Muitos já apelidaram essa legislação concorrente de Regime Desesperado de Contratações, em função do conhecido e oneroso atraso do cronograma para a Copa e do notório “empacotamento” de muitas obras do PAC.
Os artigos 8º e 9º da lei 12.462/2011, que criou o RDC, permitem a chamada “contratação integrada”. Por ela, a empresa vencedora da licitação fica responsável tanto pelos projetos básico e executivo como pela realização da obra, o que atualmente é vedado pela Lei das Licitações.
Dessa forma, a licitante fica estimulada a produzir um projeto básico que implique em maior gasto, já que será ela mesma que fará a obra: interesses articulados, valores majorados.
Pela sistemática da Lei das Licitações, após apresentado o projeto básico é aberta outra licitação, na qual diversas empresas apresentam suas propostas para o projeto. No RDC isso não existe, anulando-se o princípio da concorrência e da comparabilidade entre as propostas.
O governo argumenta que a “contratação integrada” agilizaria o processo. Supõe-se que os preços também… Frente à crônica demora para tocar obras públicas, o governo facilita as etapas das licitações. A pressa, aqui, pode ser inimiga da transparência e da austeridade.
O artigo 20 da lei 12.462 amplia o conjunto de licitações nas quais será aplicado o critério de “técnica e preço”, favorecendo a subjetividade no julgamento da disputa. A norma antiga restringe o uso do fator “melhor técnica” a serviços de cunho intelectual, em especial.
O artigo 24 também amplia hipóteses subjetivas para a desclassificação de concorrentes, ao mencionar “vícios insanáveis” e “preços inexequíveis” sem definir exatamente o que são esses óbices. Os artigos 29 a 33 abrem o leque das hipóteses de estabelecer uma pré-qualificação dos concorrentes, mais um elemento para limitar os certames.
Portanto, estender o RDC ao PAC é duvidoso e pode abrir comportas para superfaturamentos. O Ministério Público Federal faz esta mesma avaliação e questiona a iniciativa permissiva.
Foi também grave o método de tramitação da matéria. É verdade que a 8.666, tida como “rigorosa”, não impediu fraudes nas licitações para obras e serviços. Mas propor lei paralela a ela embutida em medida provisória, a 559/12, estranha ao tema, como foi a opção do governo, é uma deformação total do processo legislativo. Acabou por forçar barganha com interesses do governo tucano de Goiás em torno da aquisição do controle acionário da CELG (Companhia Energética de Goiás) pela Eletrobras.
O Executivo abdicou da iniciativa mais lógica e democrática: enviar projeto de lei ao Congresso, que analisaria a proposta, realizaria audiências públicas com os setores interessados e, afinal, a votaria, com o zelo que matéria desse tipo exige.
Colocar o RDC em “carona” de MP é secundarizar um debate importante e desconsiderar o Legislativo. Além de, com essa pressa e esse método estranho, levantar suspeitas que reavivam o adágio popular: “Jabuti em árvore? Foi enchente ou mão de gente”.
CHICO ALENCAR, 62, professor de história, é deputado federal pelo PSOL-RJ e líder da partido na Câmara
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JILMAR TATTO
SIM
Licitações mais rápidas e baratas
Desde a adoção do Regime Diferenciado de Contratações (RDC) como marco legal das obras preparatórias para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016, ficou claro que podemos avançar no tocante à agilidade na execução e no estabelecimento de melhores preços nos empreendimentos públicos.
O balanço é positivo e enseja iniciativas que, ao mesmo passo, melhorem a infraestrutura do país e atualizem a legislação, de forma a adequá-la a parâmetros internacionais. A lei 8.666, de 1993, que rege as licitações e contratações públicas, revelou-se defasada, com brechas que abrem caminho para problemas de toda natureza.
Com o RDC, os avanços são visíveis. Onde esse regime foi aplicado, o tempo médio de finalização dos processos licitatórios caiu de 250 para 80 dias. Houve redução aproximada de custos na ordem de 15% nos valores das licitações. E sem prejuízos à fiscalização, já que o regime diferenciado garante total acompanhamento por parte dos órgãos de controle interno e externo.
Agora, a extensão desse novo sistema para as obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) está sob a análise do Senado, depois de aprovado pela Câmara.
Temos, assim, a oportunidade de expandir esse regime modernizante a áreas estratégicas.
O valor dos investimentos do PAC, no período entre 2011 e 2014, é de R$ 955 bilhões, dos quais R$ 204,4 bilhões foram executados em 2011.
O grande vulto dessas ações e seu impacto no desenvolvimento nacional, inclusive com a geração de milhares de empregos, tornam ainda mais evidentes os benefícios de sua inclusão no RDC: racionalização dos procedimentos, diminuição dos prazos e, principalmente, dos custos.
O RDC, proposto pelo governo e aprovado no ano passado pelo Congresso, contou com contribuições expressivas dos órgãos de controle e dos partidos, inclusive da oposição. Não significou flexibilização. Pelo contrário, conferiu mais rigor ao sistema atual, na medida em que ampliou de forma significativa as concorrências públicas.
É o caso, por exemplo, da contratação integrada, que impõe às empresas a entrega da obra em plenas condições de funcionamento, como ocorre em vários países.
Tão importante quanto esses resultados é o fato de que o novo regime mantem cada uma das normas e princípios da lei 8.666 relativos à transparência, à fiscalização e ao controle das ações governamentais, e respeita os princípios da impessoalidade e da moralidade.
A diferença está na aplicação da experiência acumulada ao longo desses 19 anos de vigência da Lei de Licitações e de todo um arcabouço jurídico que promoveu aperfeiçoamentos nos processos licitatórios, inclusive por meio da internalização de práticas adotadas nos Estados Unidos, na União Europeia e por organismos como o Banco Mundial.
São pertinentes muitas das preocupações com a proposta. Afinal, em que pese o controle exercido pelos mecanismos institucionais de fiscalização, é fato que as contratações públicas no Brasil persistem como fonte de desperdício dos recursos públicos e de corrupção.
O que o RDC pretende -e tem conseguido- é justamente atacar esses males, afastando, por exemplo, a possibilidade de recursos e impugnações protelatórios e, em certos casos, estimulando os licitantes a disputarem a definição de custos, propiciando o rebaixamento dos preços.
Esses avanços procedimentais e esses ganhos efetivos podem e devem ser estendidos e otimizados. Ao aprovar a ampliação do RDC para as obras do PAC, o Congresso Nacional dará mais uma importante contribuição ao Brasil.
JILMAR TATTO, 46, formado em história, é deputado federal pelo PT-SP e líder do partido na Câmara
Filed under: Direito, Política Tagged: licitações, PAC, RDC licitações Copa do Mundo Jogos Olímpicos
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